Não bastasse o Tribunal de Contas do Estado ter rejeitado as contas da Prefeitura de Santos de 2016 em razão do elevado déficit fiscal ocorrido naquele ano, 2018 encerrou com situação semelhante, o que pode provocar problemas idênticos em breve.
Além do déficit milionário, o órgão estadual desaprovou recentemente as contas, entre outros motivos, pelo fato das alterações orçamentárias terem atingido 32,07% da despesa fixada, acima dos 20% previstos na lei orçamentária municipal.
No final do ano passado, a Câmara aprovou a diminuição deste movimentação para 10%, índice, porém, válido apenas para o orçamento de 2019.
Conforme relatório do TCE, em 2016, o déficit da Prefeitura chegou, com dívidas de curto prazo com fornecedores, a R$ 147.873.623,74.
Pelo portal da transparência do Município, o déficit ao longo de 2018 está em R$ 201.719.359,91 (dados retirados às 14 horas desta quinta, dia 17).
Ontem (16), a dívida com fornecedores ao longo do ano passado chegava a R$ 215,493 milhões.
Ainda existem outros R$ 2,9 milhões referentes a dívidas de 2017 e cerca de R$ 600 mil de anos anteriores (até 2013), valores não alterados até o momento.
Lixo e limpeza urbana
Do total de R$ 201,7 milhões, R$ 105,5 milhões são devidos à Terracom – empresa responsável pela coleta de lixo e limpeza urbana no Município e maior credora da Cidade.
Isso equivale a 52% do total da dívida com fornecedores a curto prazo.
Por sua vez, a Prefeitura alega que o débito com a empresa foi de R$ 104,6 milhões até final de 2018 (ou seja 70,7% do total, levando em consideração o déficit total divulgado pela Prefeitura).
Já da dívida pendente em 2017, a Terracom responde por 56,6% (R$ 1,6 milhões).
Além disso, conforme o portal, apenas nos primeiros 16 dias de 2019, já existem mais R$ 43,7 milhões a serem quitados com fornecedores e prestadores de serviços.
Números variáveis
Os números variam a cada dia e hora de acordo os pagamentos efetuados pela Secretaria de Finanças.
Ou seja, a alteração é natural.
Tanto que a Prefeitura de Santos informa números divergentes aos existentes no seu próprio portal.
De acordo com a Secretaria de Finanças, “o Município de Santos encerrou 2018 com uma dívida de curto prazo de R$148,7 milhões com seus fornecedores”.
Segundo a pasta, “houve uma redução de R$ 59,3 milhões em relação ao início de 2017, quando a dívida era de R$208 milhões. Uma redução de 28,5%”.
No entanto, sob a ótica atual, há divergência nos números.
Depende, portanto, do ponto de vista e da realidade financeira do momento.
Além disso, há diferença entre o valor liquidado (quando o serviço foi executado) e valor a ser pago (quando efetivamente foi feito o pagamento).
Esta alteração justifica as variações constantes.
Deve-se salientar que os valores não incluem os dois empréstimos tomados pelo Município no final do ano, com aval da Câmara, totalizando R$ 111,7 milhões para execução de obras na Entrada de Santos e Zona Noroeste.
Este montante, obtido via empréstimo com a Caixa, será pago ao longo dos próximos anos (e governos).
Desta forma, pouco afetará os gastos na atual Administração, que se encerra em 2020.
Dívidas contínuas
Aliás, o déficit com fornecedores (a curto prazo) tem se tornado recorrente na Prefeitura de Santos.
Conforme o levamento do Tribunal de Contas, no (primeiro) mandato do prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), entre 2013 e 2016, “ficou evidente a deterioração da situação financeira, vez que o prefeito em exame herdou um caixa positivo de R$ 181.459.108,85 da Administração anterior e, após sucessivos déficits orçamentários, de (-) 0,31% (2013), (-) 2,55% (2014), (-) 13,02% (2015) e (-) 9,07% (2016), terminou sua gestão com uma dívida, até então inexistente, de (-) R$ 147.873.623,74″.
Além disso, segundo o órgão, a dívida de longo prazo aumentou 13,7% em um ano.
Ou seja, passou de R$ 292.294.005,03 em 2015 para R$ 332.351.362,91 em 2016.
Assim como a de curto prazo, que saltou de R$ 402.753.689,05 para R$ 587.746.340,75 no mesmo período – alta de 46%.
“Isso deixa o município em situação de iliquidez (R$ 0,40 de disponibilidade para cada R$ 1,00 de dívida)”, apontou o relatório.
A Prefeitura, por sua vez, alega que irá recorrer da decisão, pois discorda dos apontamentos do órgão.
O prazo para recorrer é de 15 dias, a partir do dia 20 de janeiro.
Situação preocupante
Ex-secretário de Finanças, Rodolfo Amaral, se mostra preocupado com os números apresentados.
“A situação está pior”, atesta.
Afinal, o déficit cresceu a despeito do aumento da arrecadação contínua em 2018, apesar dos números finais ainda não terem sido divulgados.
Amaral lembra que as receitas municipais cresceram ao longo de 2018.
Isso graças à entrada em vigor, a partir de abril, do aumento do ISS para empresas portuárias (de 3% para 5%), além do incremento no IPTU para firmas do setor.
Esta era uma luta a qual o Município travava contra o segmento desde o final do século passado, conforme decisão do STF – Supremo Tribunal Federal.
O ISS, que se mantinha na casa dos R$ 40 milhões arrecadados mensalmente antes da alteração da alíquota, subiu para R$ 60 milhões em outubro passado, por exemplo.
Além disso, parte das empresas portuárias quitaram o IPTU a medida que a decisão do STF obrigou o recolhimento devido do imposto, inclusive retroativo.
Algumas se anteciparam e aproveitaram os descontos oferecidos pela Prefeitura, via programa de refinanciamento (Refis), encerrado em agosto.
Desta forma, justificam-se os resultados positivos: em julho, o valor total recolhido com o IPTU chegou a quase R$ 30 milhões.
Mais que dobrou em setembro (R$ 64,4 milhões), reflexo do Refis.
Cobrança no IPTU
“Está pior que na época do PT”, lembra Rodolfo Amaral, que foi secretário do ex-prefeito Beto Mansur (1997-2004).
Na ocasião, ele ‘herdou’ a Prefeitura com folhas de pagamento atrasados e dívidas do antecessor, o falecido prefeito David Capistrano (PT).
Crítico à atual situação financeira da Prefeitura, Amaral também questiona o motivo a qual a Prefeitura não paga pela coleta de lixo à Terracom.
Isso a despeito do contribuinte pagar pela taxa, por meio do IPTU, conforme constam nos milhares de carnês.
A coleta de lixo é um dos itens que compõem o imposto predial e territorial urbano.
O IPTU é a segunda maior fonte de arrecadação direta do Município.
Com base no mais recente levantamento, nos últimos 12 meses (de novembro/17 a outubro/18), a Cidade arrecadou quase R$ 480 milhões somente neste imposto.
“A ex-presidente Dilma Rousseff foi cassada pelo mesmos motivos”, disparou o profissional.
Assim, ele lembra das ‘pedaladas fiscais’ que custaram o mandato da ex-governante.
Em nota, a Prefeitura informa que “o Município continua mantendo o rigor na execução de suas despesas e buscando o aperfeiçoamento de sua receita para acelerar a obtenção do equilíbrio de suas contas nos curto e médio prazos”.