“Nada de novo no front” (Im Westen nichts Neues) é uma obra literária de cunho pacifista, publicada em 1929 – ano emblemático -, de autoria de Erich Maria Remarque, escritor alemão de sobrenome pertinente.
Nela, o autor relata sua experiência durante a Primeira Guerra Mundial.
Não é uma tese escrita por teóricos, para celebração em ambientes acadêmicos; mas uma história vivida em meio aos horrores de um conflito que, ao que consta, rendeu mais sequelas do que outros, ou seja, foi ainda mais insano e aterrorizante, em meio a trincheiras, lama e gases letais.
Erich a viveu em sua juventude, recém-saído da adolescência.
Seu protagonista é Paul Baumer. Ele e seus amigos são motivados por um professor carismático a se engajarem voluntariamente naquele conflito, com um discurso era cheio de idealismo e ufanismo.
Gramsci ainda não havia escrito seus “Cadernos do Cárcere” (1929-1935), o que mostra que os métodos independem de ideologia; que condicionamento e doutrinação fazem parte da história da Civilização.
O conceito da “guerra justa” foi definido na Antiguidade como um conflito moralmente aceitável.
O problema é saber se quem o provoca é moralmente decente.
Além disso, a maioria das conflagrações, civis ou entre países, é causada por questões de poder político, econômico ou religioso, com os vencedores contanto a história a seu modo, e os inconformados condenando seus mitos à morte insepulta, ressuscitados para motivar novos seguidores, sobretudo na seara fértil da juventude.
Personagens de direita e esquerda escreveram teses cujas práticas são baseadas em regras insofismáveis, lideranças inquestionáveis e doutrinação desde a infância.
Em geral, elas postulam que os fins justificam os meios, e que o sucesso depende da conversão ou aniquilação de qualquer oposição, seja no campo das ideias, seja no de extermínio.
O resultado dessas práticas tem sido revoluções que raramente resultaram em evoluções, e cuja violência gerou contrarrevoluções. Teorias de dominação, na prática, sempre são escritas com o sangue de jovens, e não de quem as concebe.
Na contramão, o livro de Erich gerou tanto impacto, que virou filme (All Quiet on the Western Front, EUA, 1930), refilmado em 1979 e agora numa versão alemã, de 2022, recentemente premiada com 4 Oscars.
Na época, ninguém parecia querer um novo confronto mundial.
Mas o Tratado de Versalhes, a escalada do comunismo, a crise de 1929 e a ascensão do fascismo comprometeram a paz, gerando novos antagonismos econômicos e ideológicos.
Milhões de jovens sofreram e sofrem morte cognitiva ou física nesse verdadeiro crime contra a Humanidade, pois, por mais que tentem justificar uma guerra, com raríssimas exceções, elas não passam de frutos da intolerância ou ganância de líderes insensíveis e carismáticos, e palco consentido de violência para psicopatas.
A Alemanha carrega o peso de ter provocado duas guerras mundiais, mas ela não está sozinha com essa culpa. Às vezes, o vencedor é tão culpado quanto o vencido.
Outros países provocaram e provocam guerras civis e entre países por interesses econômicos, travestidos de ideológicos, pois, em verdade, querem mercado para seus produtos, inclusive bélicos, e garantia de obtenção de matérias-primas e alimentos.
O pacifismo é encarado como fraqueza, num mundo em que, para ter paz, é preciso estar preparado para a guerra; em que o equilíbrio não é obtido pelo consenso humanista, mas pelo poder de dissuasão.
Em contrapartida, ainda existem professores como os da obra de Erich, doutrinando seus alunos, aproveitando-se da paixão da juventude para impor suas crenças políticas e religiosas, ensinando ódio e intolerância.
De fato, não há nada de novo no front.
Adilson Luiz Gonçalves é escritor, engenheiro e pesquisador universitário e membro da Academia Santista de Letras
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