Enquanto autoridades defendem a vacinação de crianças contra a Covid, doença que matou mais que outras enfermidades infantis no País no ano passado, uma polêmica ganhou as redes sociais.
Em seu Instagram, o conselheiro tutelar em Santos, no litoral paulista, André Alves, postou opinião contrária a apresentação do documento de vacinação nas escolas.
“Estou Conselho Tutelar de Santos e não aprovo a obrigatoriedade da vacina como condição para frequentar as aulas. Parabéns TRF-2”, escreveu.
Sua posição – que poderia se limitar aos seus grupos nas redes sociais – ganhou repercussão quando foi curtida pela deputada Carla Zambelli (União Brasil), uma das maiores defensoras do presidente Jair Bolsonaro.
Por sua vez, Bolsonaro é um dos maiores críticos à vacinação em crianças.
Ele próprio assegurou que não iria vacinar sua filha, Laura, de 11 anos.
Eleito, o conselheiro tutelar é um agente público, remunerado com recursos municipais.
No entanto, a Secretaria Estadual de Educação não impede que as crianças frequentem as escolas, ainda que não vacinadas.
Porém, as escolas de São Paulo têm obrigação, por lei, de informar o conselho tutelar, caso os pais não apresentem o comprovante de vacinação das crianças.
Ou seja, por ironia, é papel do próprio conselho receber estas demandas, fato criticado pelo próprio agente público.
ECA
Além disso, não bastasse, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), documento que rege obrigações e direitos de menores e adolescentes, é bem claro no artigo 14.
“É obrigatória a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias”.
Por sua vez, a secretaria de Educação do Estado informa que apesar de não ser impedimento para realização da matrícula, pois a medida fere o direito à Educação, a escola, por lei, tem a obrigação de informar os órgãos responsáveis (Conselho Tutelar) da não apresentação dos comprovantes vacinação por parte dos pais ou responsáveis.
Ex-conselheiro tutelar e atual vereador em Santos, Augusto Duarte (PSDB), criticou a publicação do agente público nas redes sociais.
“Lamentável”, disparou.
“Vai contra o que diz o ECA. Ele deveria estar cumprindo seu papel”, acrescentou durante participação no programa Jornal Enfoque – Manhã de Notícias de hoje (17).

Dia E
Pelo menos 60% das crianças paulistas já receberam a primeira dose da vacina contra a Covid-19.
Assim, o governo paulista vai promover uma semana de vacinação contra a Covid-19 nas escolas paulistas, entre os dias 19 e 25 de fevereiro.
Dessa forma, a iniciativa será realizada tanto em escolas públicas como privadas em municípios que aderirem à campanha.
Assim, a ideia é que as crianças sejam vacinadas no horário escolar, ficando as cidades responsáveis em definir as estratégias de imunização.
Ao todo, São Paulo vacinou 2,4 milhões de crianças de 5 a 11 anos de idade, cerca de 60% da população.
Segundo a coordenadora do Plano Estadual de Imunização de São Paulo, Regiane de Paula, é preciso que esse número cresça ainda mais.

Anvisa
Durante audiência realizada no Senado, o presidente da Anvisa, Antonio Barra Torre, reforçou a importância da vacinação.
“O número de mortes de crianças por Covid foi maior que outras doenças previsíveis com a vacina”, salientou.
Dessa forma, até janeiro, foram cerca de 1.500 crianças que perderam a batalha contra o vírus.
Por sua vez, Barra Torre salientou que ao contrário da vacinação entre adultos, cujos números são expressivos, a vacinação tem números preocupantes junto às crianças.
“A vacinação entre crianças tem ritmo dissociado ao ritmo dos adultos, o que é terrível”, salientou.
Assim, ele credita a situação à falta de informações por parte dos pais e responsáveis que ainda não vacinaram seus filhos.
“O mundo enfrenta duas guerras. E a primeira é a de informação, que afeta a outra, a da saúde, nesta pandemia”, enfatizou.
Opinião semelhante do fundador da Anvisa e um dos precursores do SUS, o médico Gonzalo Vecina Neto.
“O conselheiro tutelar deve seguir o que está no ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente, que é bem claro em relação às vacinas”.
Ele participou do Jornal Enfoque – Manhã de Notícias de sexta, onde abordou este – entre outros assuntos.
Outro lado
Dessa forma, a Reportagem encaminhou e-mails tanto à Prefeitura como ao conselheiro tutelar para se posicionaram sobre o tema.
Apenas a prefeitura respondeu, após dois dias do pedido de resposta.
Segue a nota:
“O conselheiro tutelar André Luiz Alves atua no Conselho Tutelar da Zona Leste (Rua Bahia, 196, no Gonzaga).
A Prefeitura esclarece que, de acordo com o ECA (artigo 131), o Conselho Tutelar é órgão permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, cujos conselheiros são eleitos pela população.
A vinculação do Conselho Tutelar é de caráter administrativo (embora não subordinado) ao Poder Executivo Municipal.
Como agente público, o conselheiro tutelar tem a obrigação de respeitar e seguir com zelo as diretrizes do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente.
A respeito da referida postagem, o Conselho Municipal dos Direitos das Crianças e Adolescentes (CMDCA), em reunião do colegiado realizada em 17/02/2022, deliberou encaminhamento ao Ministério Público a notícia do fato para apuração e providências, desde que se constitua infração a ação do conselheiro”.