A árvore que esconde a floresta | Boqnews

Opiniões

05 DE SETEMBRO DE 2013

A árvore que esconde a floresta

Por: Da Redação

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A denúncia nasceu durante reunião do Conselho da Cidade
de São Paulo, na semana passada. A voz era de Anderson Lopes Miranda,
integrante do Movimento da População em Situação de Rua, da capital. Segundo
ele, moradores de rua estariam sendo despejados durante a madrugada, no bairro
do Jabaquara. Os responsáveis pela “exportação de gente” seriam funcionários da
Prefeitura de Santos.

De acordo com Anderson Miranda, muitos moradores de rua
procuraram o movimento para pedir ajuda. A denúncia foi publicada, no último
dia 4, na coluna de Sônia Racy, no jornal O Estado de S.Paulo. A secretária de
Assistência Social, Rosana Russo negou as acusações e disse que “não exportamos
seres humanos”.

É complicado provar as denúncias, assim como é evidente
que não se trata de prática inédita. Nos anos 90, a Prefeitura de São Paulo foi
acusada de fazer o processo inverso. Eram famosas as kombis que largavam
pessoas aos pés da Serra do Mar.

Outros
casos aconteceram no Paraná. Na década passada, cidades do interior despejavam
andarilhos em Curitiba. Em entrevistas, muitos moradores eram favoráveis à
faxina de seres humanos. Não é preciso caminhar muito para ouvir opiniões
semelhantes em Santos. Pouco se toca no assunto, pois prevalece a invisibilidade
diante do desigual que dorme em papelão.

É difícil romper com uma estrutura viciada. Ações
isoladas não garantem mudanças na infraestrutura. É preciso, além de espaços
físicos, profissionais bem remunerados, qualificados e com condições de
trabalho.

Uma das assistentes sociais, convocada recentemente por
conta de concurso público, procurava em seções da própria Secretaria de
Assistência Social vaga para um morador de rua. Ele frequenta o Centro de
Referência Especializado para População em Situação de Rua, o Centro POP,
inaugurado no final do primeiro semestre.

Todos
os abrigos e albergues estavam lotados. O prefeito Paulo Alexandre Barbosa
disse, ao jornal O Estado de S.Paulo, que a cidade dobrou para 400 o número de
vagas em abrigos. Mas o município tem cerca de mil moradores nas ruas. Com noites
chuvosas e frias, o déficit fica exposto, da mesma forma que as marquises são
insuficientes para quem procura um prato quente de sopa.

Esta semana também começou a circular, nas universidades,
o recrutamento da FIPE. O anúncio chama estudantes para trabalhar no censo de
população de rua. A Prefeitura vai pagar R$ 221 mil à instituição ligada à USP.
Seria uma noite de trabalho em outubro, com entrega dos dados em 180 dias. É
possível contabilizar uma população, com características nômades, numa noite?
Fará diferença se alcançarmos mil moradores ou 830 pessoas, segundo dados
considerados defasados pelos próprios operadores sociais?

Embora no papel a administração fale numa comissão de
cinco secretarias, o problema da população de rua ainda não é tratado de
maneira conjunta. Na prática, é uma árvore que mascara a floresta, carente de
políticas públicas, que gritam por um trabalho além do mandato de quatro anos.

Nesta semana, começou a funcionar em Santos uma unidade
da Cristolândia, ligada à Igreja Batista. O grupo atua na Cracolândia, em São
Paulo. No próximo mês, outra entidade – a Missão Belém – trabalhará também no
atendimento aos dependentes químicos.

A Prefeitura trabalha com dados da Unifesp, que indica
que 86% dos moradores de rua são dependentes de álcool e outras drogas. Sem discutir
a doutrina religiosa destas entidades, é essencial o diálogo e a troca de
informações para que todas as ações sejam conectadas a longo prazo. As árvores
às margens da floresta agradecem.  

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Em tempo: agradeço à advogada Deise Ventura, especializada em Direito
Internacional, pelo título desta coluna. Ela se referia à xenofobia contra os
médicos cubanos. No fundo, outro problema – também marcado por um falso debate
– que esconde as fragilidades das políticas públicas no país.

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