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Opiniões

31 DE OUTUBRO DE 2013

O rei é o dono da história?

Por: Da Redação

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Assisti, nesta semana, às entrevistas do cantor Roberto
Carlos, no Fantástico, e do escritor Paulo Cesar de Araújo, no Roda Viva, da TV
Cultura. Paulo escreveu a biografia “Roberto Carlos em detalhes”, proibida de
circular desde 2007, após acordo entre a editora Planeta, que publicou o livro,
e o cantor.

Segundo o jornal Folha de S.Paulo, Roberto Carlos teria
pedido a entrevista, e não a Rede Globo. O cantor enfrenta uma crise de imagem,
associada ao autoritarismo e à censura. Cabe salientar que a jornalista Renata
Vasconcelos fez as perguntas necessárias sobre a polêmica em torno das
biografias não autorizadas, liberdade de expressão e direito à privacidade.

Roberto Carlos fez o que se esperava dele. Nunca disse
não, escorregou por todos os lados e, na prática, manteve a opinião, ainda que
dita de maneira mais leve, para enganar os apressados, muitos deles
jornalistas.

O cantor disse que não era contra as biografias não
autorizadas, desde que houvesse um acordo entre biógrafo e biografado. Se
precisa de acordo, é óbvio que se trata de autorização, de salvo conduto para
que se escreva sobre pessoas públicas.

Roberto Carlos usou seus colegas medalhões da MPB para
atender aos próprios interesses. O Movimento Procure Saber, que reúne Chico
Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan e Milton Nascimento, entre outros
artistas, nasceu para discutir direitos autorais. No Brasil, o sistema de
pagamentos (e de fiscalização) é mais bagunçado do que saída de show.

Roberto Carlos foi quem levou a discussão sobre o artigo
20 do Código Civil para o grupo. Foi ele quem ressuscitou o debate sobre
liberdade de informação e privacidade, depois que a Associação Nacional dos
Editores de Livros entrou na Justiça para forçar a queda do artigo.

O rei tentou redesenhar os fatos novamente quando disse
que proibiu a circulação do livro porque era o único recurso daquela época. E
que poderia conversar a respeito. Driblando as palavras, o cantor sabe que o
artigo é o mesmo recurso jurídico disponível. Ele não vai liberar o livro.

O
escritor Paulo César de Araújo repetiu o que Roberto Carlos dissera anos atrás.
O rei é adepto da turma do “não li e não gostei”. O cantor nunca leu o livro
que escreveram sobre ele. Aliás, a obra é fruto de 15 anos de pesquisas, pode
ser encontrada na Internet, não divulga informações além das já publicadas (muitas
presentes em letras do próprio cantor) e, no saldo, valoriza a importância o
rei na cultura nacional. O foco da obra é apontar Roberto Carlos como fator de
influência em movimentos culturais como a Tropicália.

Paulo
César contou que o problema entre os dois era dinheiro, os lucros em torno do
livro. Nada mais sintomático. No final da entrevista ao Fantástico, Roberto
Carlos disse que começou a gravar depoimentos para uma autobiografia. Faltava
alguém para escrevê-la.

O
cantor explicou que ele é o único que pode contar a própria história. Ele tem o
direito de fazê-la, mas daí entender que o rei é soberano absoluto sobre
informações públicas soa arrogante, narcísico e controlador.
 

A História
jamais é única. Mas, às vezes, tenta-se enterrar o óbvio. Nada mais infantil do
que acreditar em verdades dogmáticas. Roberto Carlos tem como propriedade a
versão da própria vida, o que não o exime de manipulá-la e pintá-las com cores
mais fortes ou leves.

Cerca
de 11 mil exemplares de “Roberto Carlos em detalhes” descansam há seis anos em
um galpão custeado pelo cantor. Ali, reside o exemplo material de como podemos
reproduzir a Inquisição. A lista de obras proibidas está aí. Falta apenas acender
o fósforo para, paradoxalmente, iluminarmos as trevas à luz da fogueira.
 

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