Paz ao Chorão | Boqnews

Opiniões

07 DE MARÇO DE 2013

Paz ao Chorão

Por: Da Redação

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Ao me encontrar na sala dos
professores, Luiz Gustavo – um colega de trabalho – foi taxativo: “Você precisa
escrever sobre o Chorão!” Respondi que o assunto era importante, mas só conhecia
as músicas principais, que tocavam nas emissoras segmentadas de rock.

Comecei a ler sobre o músico na imprensa. E, obviamente,
mudei de ideia. Alerto que este texto não é sobre o Chorão; ao menos,
diretamente. É sobre o que se faz com a imagem dele e, principalmente, como se
tortura psicologicamente familiares e amigos com doses cavalares de
especulação, mais algumas miligramas de irresponsabilidade.

Em
termos criminais, o cantor é vítima. E deveria ser tratado como tal. Com que
direito peritos divulgam fotos do apartamento e do corpo? Ninguém se preocupou
em questionar o procedimento, que rasga os manuais técnicos da polícia. Os
peritos quiseram fazer média com a imprensa? Ou apimentar, de forma
irresponsável, a sede de sangue?

Chorão
era uma figura pública e também deveria ser tratado como tal. Parece
ingenuidade em tempos nos quais a fronteira entre público e privado se esvaiu,
mas não podemos encarar a exposição de situações-limite como natural. Até
porque envolve um processo artificial de construir e legitimar personagens.

Criamos uma espécie de código perverso, no qual as
figuras famosas perdem seus direitos de privacidade assim que ser tornam
conhecidas. Exercitamos nossa morbidez em construir teses sobre a vida alheia,
de modo que também nos reconfortamos em preservar nossos mundos ordinários.
Podemos expor nossas vidas em fotos e declarações irrelevantes nas redes
sociais, desde que as reações sejam compatíveis com o universo de sonhos.

Nessa ciranda movida à hipocrisia, ficamos indignados
quando sofremos críticas ou quando nos tornamos alvos das línguas soltas que
acreditamos ter amarrado com nossas fantasias de pertencimento e
reconhecimento.

Transformamos a vida alheia a partir de contornos de
dramaturgia de banca de jornal. As causas biológicas da morte de Chorão ficaram
presas no pé da última página. O sofrimento de um sujeito que dava sinais
sólidos de dependência química se tornou nota de rodapé. Para muitos, só
reforçou ideias pré-concebidas que se sustentam em intolerância e moralismo.

O
que prevalece é a eleição instantânea de heróis e vilões. O músico foi
santificado. Não cabe a mim discutir o valor da obra dele. Mas me soa apressado
colocá-lo em um falso panteão onde residiriam Cazuza e Renato Russo, como fez
um apresentador de TV. Qual o critério de escolha? Ter também uma banda de rock
e morrer cedo?
 

A lógica esquizofrênica desta mídia afobada por audiência
inclui elevar à vilania – sem assumir que o fez – a ex-mulher do cantor.
Graziela Gonçalves, em questão de horas, entrou em metamorfose e saiu como a
megera que provocou uma depressão em Chorão quando se separou dele.

Nasce, neste ponto, o capítulo seguinte, com o choque de
versões. Muitos desfiando tratados filosóficos, muitas opiniões a partir de
teorias conspiratórias. E pouco esclarecimento sobre um homem de 42 anos, com
recursos e cercado de gente, que alcançou um patamar devastador de dependência
química.

A depressão foi diagnosticada? Por que não recebeu o
tratamento adequado? Um jornalista chegou a dizer que, ao trabalhar com Chorão,
concluiu que ele sofria de transtorno bipolar. Um psiquiatra nato, talvez.

Que Chorão descanse em paz! E os que realmente se
importavam com ele, também! Mas preparem-se: ainda não se colocou na mesa o
dinheiro, via exploração contínua da obra dele. Uma novela, claro, à revelia do
protagonista.   

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