Por um lado, houve uma grande frustração com as perspectivas decorrentes da chegada da Petrobras que – em 2011 anunciou a construção de três torres e geração de 6 mil novos empregos – brotando de fato deste projeto apenas um prédio. Por outro, o sonho do pré-sal deu visibilidade a um bairro esquecido da Cidade. Pequeno, com 0,18 km², e um baixo índice de moradores (apenas 251), o Valongo está ressurgindo das trevas. Foram anos sem investimentos, abrigando usuários de drogas e histórias de que por ali o tráfego era proibido após um determinado horário.
Depois da Petrobras, porém, surgiram novos empreendimentos como o Museu Pelé, o Restaurante Escola. Em sua principal rua, a São Bento, as mudanças são visíveis com novos bares, negócios que foram além do comércio para caminhoneiros e a até mesmo a renovação da esperança de espaços tradicionais como o Paulista. Grandes projetos como o Porto Valongo ganharam fôlego. Lembram dele? Melhor deixar para outrasedições já que de real só promessas surgiram, com grandiosos estudos e viagens ao exterior, assim como a ligação Santos/Guarujá. Outra lenda regional ainda mais antiga.
Junto a este processo sempre esteve presente, entretanto, a Cultura, mas a urbana, quase marginal, com intervenções de coletivos e grupos da Cidade ocupando o Centro, dando vida às esquinas e ruas esquecidas. Depois migraram também os eventos. De julho para cá, festivais tomaram às ruas como o Lab.Irinto, Santos Jazz Festival, Mirada, Tarrafa Literária, Curta Santos, Festa reinaugurando do dia 1º de setembro a reivindicada Cadeia Velha*…
E nesta semana, este pequeno bairro ganhou ainda mais reforço da cultura com a primeira edição do Festival Internacional da Imagem – Valongo, promovido pelo Estúdio Madalena de São Paulo. São cinco dias de evento, com programação nos já conhecidos espaços como Casa da Frontaria Azulejada e Museu Pelé, mas também abrindo novas portas, como os Arcos do Valongo e o próprio centro de Estudos do Estúdio Madalena em parceria com a Unimes.
Segundo um dos organizadores, Iatã Cannabrava, são muitos os motivos para as regiões se tornarem abandonadas, assim como são variadas as possíveis soluções. “No nosso caso, desenvolvemos há 20 anos eventos que utilizam a fotografia como instrumento de avanço social (…) O que planejamos para este? Que fosse um festival que mexesse culturalmente a região, que servisse de instrumento para projetos específicos organizados; e um projeto que com educação e moradia ajudasse em um movimento de urbanização. Neste sentido, vamos criar uma Universidade de Narrativas Visuais. Vamos convidar todas as universidades para formar este Núcleo no Valongo”, explica.
Para março do próximo ano já existe um curso piloto de Narrativas Visuais. E a ideia é que moradores do Valongo ganhem bolsas integrais ou parciais. Iniciativa que irá itensificar ainda mais o selo de Cidade Criativa na área do audiovisual, concedido pela Unesco.
Há mais de 40 anos na Rua São Bento, o restaurante Paulista acompanhou todas as mudanças do bairro, do auge à queda e a valorização novamente do espaço. Nesta semana, recebe a exposição Barney Days. Francisco Gonçalves Filho, que chegou com 29 anos na rua e hoje está com seus 74 anos, lembra bem dos banquetes que servia no tempo áureo e vê com animação a realização de festivais e eventos que ocorrem no Centro Histórico. “Seria bom se fosse sempre assim, com todo este movimento na rua”, conta. Único dos primeiros sócios que permanece desde a fundação, Francisco ganhou novos sócios e tem a certeza das escolhas que fez. “Vou te falar que não é fácil se manter nos dias de hoje, com esta crise, mas a gente está aqui há mais de 40 anos no mesmo espaço e sempre espera melhorar”, explica Francisco, que se diz feliz com as transformações do entorno.
Os sócios André Garrido e Anderson Silva (Dan Silva) estão há sete meses na Rua São Bento. O imóvel fechado há 15 anos da família de André recebeu uma ampla reforma, uma decoração vintage para abrigar um sonho antigo, abrir uma Barbearia. Ele estava cansado da rotina de sua antiga empresa quando decidiu arrendá-la para abrir o novo negócio e aproveitou o espaço da família. Conheceu Dan Silva neste processo e fez o convite, que aceitou meses depois. No descolado espaço, clientes se tornam amigos e a brincadeira acontece a todo momento. Difícil não rir com a turma. Além dos sócios mais dois rapazes completam a equipe, que corta cabelo, bigode e barba com muito humor. E o espaço recebe a exposição, até domingo (16), de fotos do TuMobgrafia. São retratos de espaços e personagens do Valongo feitos por celular. Os dois concordam que há muito para melhorar no bairro, mas que o cenário já está bem melhor. “Não tem mais os usuários de drogas. Outros empreendimentos também vieram para cá e a rua está cada vez mais movimentada”, contam.
*Trecho modificado para correção. O evento que reinaugurou a Cadeia Velha de Santos não foi o Curta Santos como estava escrito mas sim o FESTA.


