Na última semana, recebi dois presentes de uma aluna da Universidade Aberta da Terceira Idade. Ela me deu um livro do escritor Rubem Alves. E me presenteou também com um recorte de jornal. Era a crônica Despedida, a última do mesmo Rubem Alves na Folha de S. Paulo.
No texto, ele aos 78 anos alega cansaço para escrever. Diz que tem cada vez mais dificuldades para encontrar algo a falar para seus leitores. E que uma crônica semanal acabou se tornando uma obrigação. Não tenho novidades a escrever. Mas tenho a obrigação de escrever quando minha vontade é não escrever.
Muitos cronistas escrevem sobre o ato de escrever quando não querem denunciar a falta de assunto. Não é o caso de Rubem Alves nem o caso deste colunista. O texto publicado na Folha me fez pensar a partir de uma frase: A obrigação: é isso que pesa.
A vida atual nos consome em obrigações. São compromissos, tarefas, acertos, ordens e outras determinações que, muitas vezes, nos tiram a capacidade de refletir sobre o que estamos fazendo. É como se nos transformássemos em hamsters que correm eternamente na rodinha de metal. Corremos em círculos, o que nos faz perder a sensação de caminhada contínua, evolutiva, com um traçado definido, mas aberto a mudanças na estrada. Novas curvas, novos obstáculos, novos roteiros, passamos por eles sem que os entendamos como tais, como mudança à vista.
A ironia se esconde no fato de que as obrigações nos tornaram exigentes compulsivos. O que mais vejo são pessoas que reivindicam o tempo todo. A ideia é pedir sempre, sentar-se na condição de cliente e esbravejar, reclamar, se queixar. Neste sentido, as verdadeiras batalhas se misturam às mesquinharias das exigências pequenas do cotidiano. Tudo parece ganhar o mesmo peso, que afasta o diálogo e, principalmente, repele a reflexão adequada e serena sobre o que nos envolve.
Tenho consciência de que sempre cumprirei obrigações. Não me refiro às prazerosas. Estas situações não se desenham como fardo. Pelo contrário, representam oásis no deserto de pedidos alheios. Um exemplo é o tempo que passo com meus dois filhos. Tempo intenso, porém curto. Tempo que gera horas de pensamentos posteriores, que vão de lembranças a novas portas a serem abertas neste relacionamento.
O que pesa, para mim, são as obrigações impostas, burocráticas, desnecessárias e travestidas de compromissos inadiáveis e emergenciais. Estes supostos deveres me atingem nas mais variadas esferas sociais, não apenas no trabalho, como muitos desejam responsa-bilidade. O trabalho nos dá pequenas vitórias e é delas que me alimento para prosseguir.
Sonho com menos obrigações. Desejo uma vida com maior liberdade, com o direito de decidir sobre os deveres a cumprir.
Mas, acima de tudo, fantasio com a vitória da poesia, que muitas obrigações insistem em ordenar a morte dela.
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