Assim como descreve o educador e hoje deputado federal Gabriel Chalita, no livro Educação – a solução está no afeto, o professor é o grande agente do processo educacional. “A alma de qualquer instituição de ensino é o professor. Por mais que se invista na equipagem das escolas, em laboratórios, bibliotecas, anfiteatros, quadras esportivas, piscinas, campos de futebol – sem negar a importância de todo esse instrumental -, tudo isso não se configura mais do que aspectos materiais se comparados ao papel e à importância do professor.”
Com tamanha responsabilidade, os professores, porém, estão perdendo gradualmente o poder e a autonomia na sala de aula, sendo vítimas – inclusive – de atos de violência. Esta desvalorização também pode ser percebida pelos salários e a falta de um plano de carreira que incentive os educadores. A consequência? É o número cada vez menor de jovens que optam pela licenciatura e cada vez maior o volume de professores que abandonam a sala de aula.
Segundo levantamento do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a questão pode ser observada pelo número de docentes na educação básica brasileira (Educação Infantil, Especial, Ensino Fundamental, Médio e a Educação de Jovens e Adultos – EJA), que passou de 2 milhões 500 mil 554 profissionais atuando em sala de aula, em 2007, para 1 milhão 977 mil 978 em 2009.
Afastados
Outro dado que preocupa é a quantidade de educadores que estão afastados por problemas de saúde. De acordo com a Secretaria Estadual de Educação, somente em dezembro do ano passado 17.514 mil dos 220 mil docentes (8%) que prestam serviço no Estado estavam afastados por motivo de licença-saúde. As enfermidades mais comuns, segundo o Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo (Apeoesp), são relacionadas a estresse, barulho, falhas nas cordas vocais, tendinite, além de problemas psicológicos.
“Os dados recentes da educação são impressionantes. Os cursos de Pedagogia, por exemplo, continuam com alta procura, mas percebe-se que os alunos que ingressam nas faculdades não têm como objetivo se especializar e melhorar a qualidade de suas aulas, mas sair da sala para conseguir funções administrativas na área da Educação”, ressalta o diretor da Faculdade de Pedagogia da Universidade Santa Cecília, com licenciatura em Biologia e Pedagogia, Fábio Giordano.
“Com estes dados e o desestímulo cada vez maior, teme-se por um apagão dos professores. Os jovens não têm interesse e os mais velhos ou se afastam ou se aposentam. E isto é uma realidade em todo o País. É necessário estimular a formação de professores a começar em ter um bom ambiente escolar na própria infância e adolescência, estimulando com que os jovens tenham interesse pela profissão”, revela.
Outra questão importante, segundo Giordano, é que os cursos de Licenciatura e Magistério não podem continuar obtendo os alunos com as notas mais baixas no vestibular. “Deveria ser ao contrário. Aqueles que tem aptidão pela Licenciatura e melhores notas é que deveriam se interessar e ingressar nestas faculdades. O profissional tem que ter uma formação moral e cultural sólida. Só assim a qualidade aumentaria”, explica.
O Governo paulista, segundo Giordano, avançou ao anunciar o projeto de um plano de carreira, com diversos fatores para avaliação dos professores e benefícios para os que tiveram bons resultados. “Ele será enviado para a Assembleia, mas já é um passo importante. É preciso estimular quem está na sala de aula. Hoje, o governo – por exemplo – oferece cursos de qualificação, mas quem irá estudar para não ter nada em troca?”, ressalta.
Árdua rotina
Para o professor de Matemática, André (nome fictício), concursado pela prefeitura de Santos como substituto e que está há cinco anos lecionando para crianças e adolescentes, a desvalorização está em todas as áreas da sociedade e não é diferente no ensino.
A vontade, explica André, era lecionar para participar da formação das crianças. “Eles serão nossos futuros médicos, artistas, arquitetos… Mas a realidade é bem diferente. Quando saímos da faculdade para lecionar, a intenção é contribuir com a formação destas pessoas, inovando, promovendo atividades diferentes, porém o dia-a-dia nos mostra que não é tão fácil. Para tudo, a burocracia é enorme e pouco conseguimos realizar de novo com os alunos. Não existe infraestrutura adequada”, lamenta.
Mesmo com pouco tempo de atuação, o professor se diz cansado e desmotivado. “Começa com a falta de interesse dos próprios alunos e dos pais, que, na maioria das vezes, aparece na escola apenas para reclamar. Eles não participam”, explica.
Segundo André, a dificuldade começa e uma simples lição de casa. “Sinto-me péssimo quando muitos não praticam em casa. Isso porque eu dou pontos para quem o faz. O pior é que se você os repreende os pais vão até a escola não para saber o que aconteceu, mas para reclamar do porquê agirmos desta forma. Não há uma ajuda para incentivá-los a estudar. É claro que não são todos. Alguns ainda ajudam, se preocupam, mas – infelizmente – são a minoria”, revela.
André começou na prefeitura com turmas nos três períodos. Hoje, trabalha apenas em uma das unidades municipais
no período da manhã, com o total de 30 aulas. “No restante do dia, atuo como professor particular. Assim ganho mais, com estresse bem menor”, ressalta.
Salário-base
Além do estresse do número excessivo de alunos na sala de aula, a pouca participação dos pais, outra questão que atrapalha é a baixa remuneração que pode ser observada no próprio salário-base de R$149,63. “Como escolhi as aulas de um professor que já está afastado há oito anos, mas continua como titular, e dou as 30 aulas dele, recebo no final do mês cerca de R$1.900. Isso por que pelas duas aulas excedentes eu recebo R$ 5,99. Os professores substitutos sem turmas, porém, recebem um pouco mais que o salário-base. Assim fica difícil segurá-los. Não há incentivo até porque nunca se sabe o quanto se receberá no final do mês”, ressalta.
Servidores reivindicam melhorias
Na última segunda-feira (4), o Sindicato dos Servidores Públicos (Sindserv), junto de educadores, teve encontro com o prefeito João Paulo Tavares Papa para colocar em pauta reinvidicações da categoria. No final do mês, educadores fizeram manifestação na Praça Independência solicitando aumento salarial.
A secretária de Educação, Suely Maia, explica que a Prefeitura destina 25% da sua arrecadação em impostos para a área da educação. “Desses 25%, 60% devem ser empregados para pagar os funcionários da rede pública. O restante é para a compra de material, reformas e construção de novos prédios. Proporcionalmente, nós temos um número de alunos e professores maior, com uma receita menor que a de outros municípios. É preciso ter um plano de cargos e salários. Outras cidades como Praia Grande e Cubatão já fizeram seu plano e ele foi aprovado pela Câmara de Vereadores. Esse plano faz avaliações no profissional e quanto maior for o desempenho maior será o salário”, explicou Suely, em entrevista ao Boqnews.
De acordo com o prefeito Papa, os educadores trouxeram questões que estão sendo analisadas. Em relação ao plano de carreira, Papa ressalta que está à espera do plano, que não seguiu para a Câmara até hoje, porque não teve o retorno do sindicato. “Quando elaboramos, em 2009, eles reagiram negativamente ao plano. Foi entregue então ao sindicato para que fizessem a crítica e apresentassem alternativas. Estamos em 2011 e gostaria de já ter aprovado o plano de carreira para todo o serviço público municipal. Mas o primeiro que será encaminhado à Câmara será o dos professores. Estamos aguardando”, diz.
Novas reuniões
Segundo o assistente social e presidente do Sindserv, Flavio Saraiva, as reuniões com professores para discutir o plano começam em agosto, mas é impossível colocar prazos. “A Prefeitura demorou para liberar a convocação para irmos até as escolas para realizarmos reuniões com representantes de todas as unidades de ensino”, ressalta.
Conforme o sindicato, a categoria pede melhores condições de trabalho e obras de infraestrutura nas escolas. De acordo com o auxiliar de Biblioteca, Rubens Mattos, a falta de estrutura adequada, principalmente, nas unidades mais antigas impede o desenvolvimento dos próprios alunos.
Prefeitura lança edital para concurso
De forma a preencher vagas na rede pública, a prefeitura de Santos anunciou a realização de concurso público para preenchimento de 914 vagas em diferentes setores da administração municipal, divididas em 33 cargos, nas áreas de educação, saúde, operacional e administrativa.
A expectativa de inscrições para esse ano é de 100 mil candidatos. O concurso anterior, realizado em 2010, teve 30.099 inscritos para sete cargos e 963 vagas. A validade do concurso é de dois anos, prorrogável por mais dois. A previsão é que o processo seletivo aconteça entre agosto e setembro deste ano.
Segundo o edital, publicado no Diário Oficial do dia 1° de julho, serão oferecidas 205 vagas para a área de Educação. As oportunidades são para: inspetor de alunos (19); professores substitutos de Educação Especial (69); de Educação Infantil (26); de Ensino Fundamental I (37); de Ensino Fundamental II – Arte (15); de Ensino Fundamental II – Ciências (5); de Ensino Fundamental II – Educação Física (5); de Ensino Fundamental II – Geografia (20); de Ensino Fundamental II – História (15); de Ensino Fundamental II – Inglês (20); de Ensino Fundamental II Língua – Portuguesa (20); de Ensino Fundamental II – Matemática (20) e de Secretário de Unidade Escolar (7).
Inscrições
As inscrições – para quem não pediu a isenção da taxa, que terminou na sexta (8), com cerca de mil pedidos – deverão ser realizadas pela internet (www.ibam.org.br) de segunda (11) até o dia 28 de julho. As taxas são de R$ 40,00 (nível operacional); R$ 55,00 (nível médio) e R$ 75,00 (nível superior).
O prefeito João Paulo Papa Tavares também informou que em agosto encaminhará à Câmara projeto de lei prevendo a criação de mais 1.081 vagas. Desde 2006, a administração municipal nomeou 6.576 aprovados em concursos, sendo que 4.223 foram efetivamente empossados.