Houve um tempo em que ir ao Centro de Santos era um programa, um evento!
Quando morávamos no início da Av. Washington Luís, íamos a pé.
Mais tarde, no então Bairro José Menino (agora Pompeia), era via Linha 17, primeiro de bonde, depois de ônibus.
Comer um pastel de queijo com caldo de cana na Sumatra, na Praça José Bonifácio, era um desejo recorrente.
Passear nas Lojas Americanas era coisa de outro planeta, com destaque para sua escada rolante. A loja da Sears também impressionava.
Eu ficava “babando”, vendo as capas de compactos simples, duplos e LPs, na Casa do Disco; ou admirando outros sonhos impossíveis: os aparelhos de som expostos na J. W. Ventura.
Minha mãe costurava a maioria de nossas roupas, e eu lhe prestava o “apoio logístico”, indo ao Centro com duas incumbências: comprar aviamentos e tecidos, e uma broa na Padaria Cirillo, que
ficava na Rua Amador Bueno.
Voltava para casa com ela queimando meu braço, tão quente que, quando chegava em casa, para o café da tarde, ainda derretia a manteiga.
Adolescente, estudante de escola técnica, trabalhei na Metromar, na Rua Amador Bueno, ao lado antigo Banco da Economia. Eu era desenhista.
Já existia o Super Centro do Boqueirão e alguns centrinhos comerciais, mas, lá, tive a sorte de participar do projeto do primeiro shopping center similar aos da capital: o Parque Balneário.
O progressivo adensamento populacional dos bairros da orla resultou no deslocamento do poder econômico para aquela região.
O Bairro do Gonzaga, que já tinha o atrativo da “Cinelândia Santista” e um comércio que cada vez mais concorria com o do Centro, com esse shopping virou um polo preferencial.
Creio que foi o primeiro “golpe” no Centro.
Seguiram-se outros shoppings centers, em bairros da orla, e o Centro foi sendo cada vez mais esvaziado.
A deterioração da área portuária na região também foi prejudicial.
Então, na década de 2000, surgiu a proposta de revitalização do cais do Valongo; a Petrobras instalou sua Unidade Operacional na região; casas de espetáculo e bares se instalaram no Centro; prédios históricos foram restaurados; surgiu o Museu Pelé; e foi criada a linha turística de bonde (o VLT cada vez mais comprova que a rede de bondes jamais deveria ter sido desativada!).
Porém, a suspensão do projeto de revitalização do cais do Valongo e a significativa redução dos investimentos da Petrobras em Santos, resultaram em um retrocesso.
Mais e mais lojas foram fechando, menos gente passou a frequentar o Centro.
Voltei a trabalhar no Centro e, por recomendação médica, durante a semana caminho cerca de 40 minutos pelas ruas da região, incluindo os Bairros Paquetá e Valongo.
Nessas caminhadas, tenho entendido o porquê da denominação “Centro Histórico”: primeira área povoada de Santos, no século XVI; berço de José Bonifácio; primeiro trecho de cais do Porto Organizado, no século XIX…
Os prédios históricos fazem voltar no tempo, mas a visão de fachadas magníficas, mas degradadas, que tombamentos nem sempre impedem de efetivamente tombarem, causa certa angústia.
A inauguração do Parque Valongo e a futura restauração dos Armazéns 1 a 3 trouxeram novo alento.
A proposta de repovoamento do Centro, seja em edificações existentes, seja em novos empreendimentos habitacionais, a atração de órgãos públicos e a promoção de eventos culturais multifacetados potencializa a retomada da pujança econômica de tempos atrás, conferindo sustentabilidade a essas iniciativas.
Sinais desse novo cenário já podem ser percebidos, e o Centro está revivendo.
É bom para o Centro! É bom para Santos!

Adilson Luiz Gonçalves é escritor, engenheiro, pesquisador universitário e membro da Academia Santista de Letras
Deixe um comentário