No último dia 9, o assunto adultização infantil ganhou força nas redes sociais depois do influenciador Felipe Bressanim Pereira, conhecido como Felca, publicar um vídeo, denunciando o influenciador paraibano Hytalo Santos por exploração de pessoas menores de 18 anos e alertando para riscos de exposição infantil nas redes sociais.
Desse modo, na última quarta-feira (20), o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o Projeto de Lei (PL) 2628/2022, que estabelece regras para proteger e prevenir crimes contra crianças e adolescentes em ambientes digitais. O texto aborda o uso de aplicativos, redes sociais, programas de computador e jogos eletrônicos.
Assim como, prevê obrigações para fornecedores e amplia ferramentas de controle de acesso por parte de pais e responsáveis.
Adultização
Segundo o coordenador pedagógico da Escola Bilíngue Aubrick, Paulo Rogerio Rodrigues de Souza, a adultização infantil acontece quando crianças são expostas, cobradas ou estimuladas de forma precoce a assumir comportamentos, responsabilidades, conteúdos ou padrões estéticos e de vida que não correspondem à sua fase de desenvolvimento e que pertencem ao universo adulto.
“Isso inclui desde o uso de roupas e maquiagem inadequadas para a idade até a cobrança de responsabilidades ou a participação em conversas impróprias. O fenômeno é preocupante, porque viola o direito da criança de viver plenamente a infância e rompe etapas fundamentais do desenvolvimento, comprometendo dimensões físicas, cognitivas, emocionais e sociais”.
Ele ainda cita que no contexto atual, marcado pela pressão estética, pela aceleração do consumo e pela exposição midiática, a adultização infantil pode gerar consequências sérias, como ansiedade, baixa autoestima e dificuldade de construção identitária. “Vivemos um tempo em que a exposição das crianças é muito maior, sobretudo nas redes sociais, o que amplia ainda mais esses riscos”.
Sinais
Sobre os principais sinais de que uma criança está passando por um processo de adultização, o coordenador comenta que aparecem em diferentes dimensões da vida de uma criança, seja comportamental, emocional e social e devem ser lidos como alertas para pais e educadores.
No comportamental, tratam-se de adoção de posturas, vocabulário e gírias próprias de adultos; preocupação excessiva com a aparência; uso frequente de maquiagem ou produtos destinados a adultos; consumo de marcas; e até reprodução de comportamentos sensualizados. Assumir funções ou preocupações que extrapolam sua capacidade emocional ou etária, como interesse excessivo por dinheiro ou pelo futuro financeiro.
Já no emocional, é a cobrança por desempenho e perfeição, o que pode gerar ansiedade, estresse, insegurança e sentimento de inadequação. E no social, a perda do interesse por brincadeiras típicas da infância; preferência por conviver com pessoas mais velhas; e busca por inserção em contextos adultos. Desse modo, no escolar, reflete na queda de rendimento, desinteresse por atividades lúdicas, foco exagerado em resultados e pressão excessiva por desempenho.
Fora das redes
Aliás, a adultização infantil também ocorre fora das redes sociais e acontece de forma bastante frequente, se manifestando em diferentes contextos.
O coordenador menciona que no ambiente familiar, pode surgir quando crianças são expostas a conversas adultas, incentivadas a usar roupas, maquiagens ou acessórios inadequados à idade, ou quando assumem responsabilidades que não condizem com sua fase de desenvolvimento, como cuidar de irmãos menores ou lidar com cobranças escolares excessivas.
Na escola, esse processo se evidencia na pressão por desempenho, competitividade exacerbada, valorização exagerada de aparência ou comportamento “maduro” em detrimento do brincar, e na limitação de espaços para experimentação criativa.
Na sociedade em geral, a adultização também se manifesta na publicidade direcionada a crianças, promovendo produtos e estéticas adultas que invisibilizam sua condição de sujeitos de direitos em formação.
Papel dos pais
Os pais e adultos responsáveis são os principais guardiões da infância. Desse modo, cabe a eles acompanhar crianças e adolescentes com frequência e proximidade.
O especialista aborda que é importante garantir limites claros no acesso a conteúdos digitais e redes sociais. Assim como, acompanhar o que a criança consome e supervisionar o uso de tecnologias.
Além de oferecer alternativas de lazer e estimular o brincar e o convívio social saudável, valorizando experiências próprias da infância. Outra alternativa é dialogar sobre consumismo, padrões de beleza e influência digital, explicando os motivos por trás das restrições e reforçando a infância como momento insubstituível, ajudando a criança e o adolescente a desenvolver senso crítico.
Outro ponto também é respeitar o tempo da infância, sem antecipar responsabilidades ou expectativas que não cabem à fase. “Mais do que proibir, o papel dos adultos é guiar, criar vínculos de confiança e oferecer um ambiente seguro para que os filhos se desenvolvam no seu tempo”.
Assim como, a pedagoga e docente da Faculdade de Educação da USP, Elaine Vidal comenta que é preciso retardar o máximo possível acesso aos dispositivos tecnológicos e quando forem inevitável fazer isso sempre com supervisão. “A criança não tem que ter celular, é preciso controlar o tempo de tela, quando essa criança for assistir alguma coisa que ela faça isso na TV ou na sala com um adulto perto e conversar com as crianças sobre isso.”
Brincadeiras
Além de proporcionar pra criança momentos de brincadeira, de lazer, momentos de ócio que a criança possa ficar sem fazer nada também é importante pra ela e investir na imaginação infantil.
Por exemplo, a pedagoga informa que pode ser oferecido para criança brinquedos não estruturados que é a criança brincar às vezes com materiais que não tem uma função clara e que vai depender da imaginação dela pra dar uma função simbólica, a caixinha de pasta de dente vira um carrinho, o lápis vira um avião e toda vez que a gente deixa a criança imaginar, estamos desenvolvendo a imaginação dela.
“Além disso, é importante muito contato com a natureza, aqui em Santos ir pra praia, se sujar, entrar na água, comer areia, essas coisas fazem parte da infância. Então, que a criança possa correr, pular, brincar, promover a interação com outras crianças, então se encontrar com amiguinhos e ir pra praia, ir pro parque, brincar em casa e evitar jogar pra crianças comportamentos de adultos né. Criança pequena, por exemplo não precisa ir na manicure, não precisa fazer unha toda semana, ela não precisa ser modelo, desfilar e tomar muito cuidado com a exposição na internet, com a publicação de fotos das crianças, tentar sempre fazer isso com o perfil fechado para evitar o acesso as crianças por pedofilos ou outras pessoas mal intencionadas”, alerta Elaine.
Infância
Além disso, a educadora comenta sobre como as escolas podem ajudar a combater esse processo e proteger o direito das crianças de viver plenamente a infância.
“As escolas podem cuidar e preservar essa infância, trazendo possibilidades de entretenimento pra essas crianças. Na escola muitas vezes que a criança vai aprender novas brincadeiras, novas formas de interagir com os amigos, aprender vivências que vão mexer com sentimento dela. Então a escola pode proporcionar esses momentos felizes de brincadeira e de interação entre as crianças e adolescentes sem a tecnologia. A primeira coisa é importante que as escolas façam cumprir a lei, a escola não é lugar do celular e não tem que ter”.
Comportamento
Desse modo, ela relembra que já ouviu relatos incríveis de escolas que com esse banimento dos celulares, os adolescentes, por exemplo começaram a jogar truco na hora do recreio, as crianças voltaram a pular corda, brincar de pega pega, tanto crianças quanto adolescentes levam instrumentos musicais e fazem rodinha de violão no recreio, um ponto saudável e que não acontecia nas escolas há alguns anos, porque o celular dominava o tempo todo a atenção deles.
Outra contribuição que a escola pode dar é estar atenta aos sinais, algumas vezes, a família não consegue perceber uma maior irritabilidade da criança, um isolamento e na escola isso fica evidente.
Portanto, a escola pode contribuir estando atenta a isso e alertando as famílias quando notar qualquer sinal e a escola pode trabalhar na formação das famílias, discutindo com as famílias padrões estéticos, cobranças na infância, a própria adultização infantil, riscos da exposição da imagem das crianças e também com as próprias crianças fazer um trabalho de educação digital. Assim abordando o que a criança assiste, como é que a rede funciona, pra onde ela vai te levar, quais são os riscos, é importante conversar principalmente com as crianças e adolescentes e a escola vai ser um espaço pra isso.
Como denunciar?
A pedagoga também comunica como um adulto pode agir ou denunciar quando perceber que uma criança está passando por adultização.
“É importante dizer que é tarefa de todos nós enquanto sociedade proteger as crianças e a denúncia deve ser feita não só se um adulto perceber que uma criança da sua família está sendo exposta a adultização, mas também outras crianças. Contudo, a denúncia depende da situação.”
Por exemplo, se é um fator que está ocorrendo na escola, é preciso uma conversa com a gestão da escola. Agora se é fora da escola, se o adulto perceber que a criança está sendo exposta nas redes, se for um caso de violência contra criança, a denúncia pode ser para a polícia mesmo, ligar ao 190 e denunciar.
Além disso, se for essa adultização, tem o disque 100 que é o canal de direitos humanos e tem também o aplicativo direitos humanos Brasil que são canais do governo federal que recebem denúncias contra crianças.
Internet
Além disso, a especialista em Segurança da Informação e sócia na IAM Brasil, Nathália Carmo cita as melhores práticas ou ferramentas tecnológicas que os pais podem adotar para garantir uma navegação mais segura dos filhos na internet.
“Falando em ferramentas, existem softwares de controle parental, filtros de conteúdo baseados em inteligência artificial, sistemas de monitoramento de atividades online e alertas em tempo real quando há risco de exposição a conteúdo impróprio.
Algumas ferramentas também fazem varredura de redes sociais para identificar conversas suspeitas e palavras-chave associadas a aliciamento ou pornografia infantil”.
Já em melhores práticas, é necessário uma conversa aberta entre os responsáveis e a criança/adolescente e estabelecer uma relação de confiança com seu filho. Ensinar eles a identificarem perfis falsos (fotos genéricas, dados inconsistentes, comportamento estranho); Incentivar denunciar ou reportar para o responsável, porque cada perfil criminoso retirado do ar pode prevenir novos ataques.
Os pais também podem identificar o que mais expõe as crianças quando estão online, que são: Perfis abertos ao público; Publicação de informações de geolocalização (fotos com localização ativada); E, principalmente, evitar que crianças usem dispositivos sem supervisão ou conectados a redes Wi-Fi públicas sem VPN. (Em redes abertas, criminosos podem “escutar” o tráfego e capturar senhas, conversas, fotos e dados bancários.
Cibersegurança
Portanto, a especialista em Segurança da Informação aborda os principais riscos que crianças e adolescentes enfrentam nas redes sociais do ponto de vista da cibersegurança.
Um deles é a exposição de dados pessoais pelo excesso de compartilhamento: nome completo, escola, endereço, rotina. Exemplo: jovens postando uniforme escolar ou localização em tempo real.
Outro é a engenharia social e grooming – aproximação mal-intencionada de adultos que se passam por adolescentes para ganhar confiança. Tática comum: iniciar amizade, pedir fotos “inocentes” e depois evoluir para chantagem.
Assim como, o cyberbullying e exposição pública – agressões virtuais entre colegas ou desconhecidos, via comentários, memes ou perfis falsos. Amplificação: nas redes sociais, uma ofensa pode viralizar e ganhar proporções incontroláveis.
Fraudes financeiras em jogos e apps – ofertas falsas de moedas virtuais, skins ou upgrades. Exemplo: phishing disfarçado de promoções em Roblox, Fortnite, Free Fire.
Conteúdo impróprio ou prejudicial – exposição a violência, pornografia, desafios perigosos.
Além da dependência digital e impacto na saúde mental – algoritmos viciantes que reforçam dopamina e prendem atenção.
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