Governos de todo o mundo estão sonhando com a IA, apostando nessas tecnologias para impulsionar a prosperidade econômica.
No entanto, eles não estão investindo no recurso fundamental que sustenta todas as nossas economias do século XXI: informação independente e verificável.
Economias bem-sucedidas dependem de informações amplamente acessíveis, verificadas e confiáveis.
O jornalismo de interesse público fornece uma fonte vital de tais informações: expõe corrupção, fraude e manipulação de mercado, traz estabilidade aos mercados financeiros, combate a desinformação e capacita os atores econômicos a fazer investimentos informados.
Sem isso, as economias nacionais, o comércio internacional e os fluxos de capital entre os países não podem funcionar adequadamente, com impactos negativos importantes no bem-estar social.
Mas esse recurso valioso está enfrentando uma crise financeira e política existencial em todo o mundo.
O Painel de Alto Nível sobre Mídia de Interesse Público, incluindo dois laureados com o Prêmio Nobel, foi formado para avaliar as implicações econômicas e sociais da crise enfrentada pela mídia de interesse público em todo o mundo.
Revisamos as evidências e pesquisamos as tendências globais com uma crescente preocupação.
Estamos preocupados com o fato de nossas economias estarem cada vez mais vulneráveis a informações que não são independentes nem precisas.
Em 2024, cerca de 90 países foram alvo de esforços patrocinados por estados estrangeiros para manipular informações.
A ascensão da IA generativa corre o risco de acelerar essas táticas e aumentar os desafios para impedir a disseminação de informações falsas online.
Enquanto isso, jornalistas independentes e organizações de mídia estão enfrentando pressões políticas e econômicas crescentes à medida que as autocracias e os interesses particulares se impõem.
Nosso relatório, The Economic Imperative of Investing in Public Interest Media, mostra por que as forças de mercado, por si só, são incapazes de sustentar esse bem público vital: modelos de negócios historicamente lucrativos estão falhando à medida que as receitas migram para plataformas online, permitindo que interesses poderosos cooptem, intimidem ou neutralizem a mídia independente.
Embora o apoio de doadores à mídia de interesse público sempre tenha sido baixo, ele agora é ofuscado pelo valor investido por atores autocráticos em propaganda.
A Rússia gasta em desinformação e propaganda – incluindo em conteúdos direcionados para fora de suas fronteiras – pelo menos três vezes mais do que as maiores nações democráticas gastam em ajuda externa em apoio à mídia livre e independente, e não é o único país a fazê-lo.
A situação é ainda mais complicada nas economias em desenvolvimento, onde a crescente desigualdade em relação ao acesso à informação exige a promoção da inovação local para corrigir parcialidades sistemáticas e desigualdades digitais, como pode ser observado no ecossistema midiático africano, por exemplo.
Sem informações confiáveis, não podemos enfrentar os desafios econômicos, sociais e ambientais mais urgentes de nossos tempos.
Do combate à crise climática à gestão de pandemias globais, a proliferação da desinformação sobre os fatos gera custos imensos.
Sem ações decisivas, tanto em nível doméstico quanto global, estamos caminhando para o que a laureada com o Prêmio Nobel Maria Ressa chamou de “um Armagedom da informação” que colocará em risco a estabilidade econômica global, o bem-estar social e o crescimento sustentável.
Pedimos urgentemente uma ação pública decisiva imediata e estabelecemos dois conjuntos de medidas prioritárias para proteger a mídia de interesse público e desenvolver as políticas públicas necessárias para moldar os mercados de informação do futuro, com vista à prosperidade econômica e o bem-estar social.
Ambos exigem uma reavaliação fundamental do valor econômico e social da informação independente e verificável como infraestrutura fundamental para mercados e sociedades prósperas.
Em primeiro lugar, os governos devem investir nos novos modelos necessários para incentivar, apoiar e proteger a mídia livre e independente.
O apoio financeiro à mídia de interesse público é uma das intervenções mais econômicas para garantir sistemas econômicos responsáveis e funcionais, com retornos econômicos e sociais potencialmente elevados no futuros.
No entanto, tais investimentos devem ser acompanhados por fortes precauções para evitar a interferências governamentais e devem promover um ecossistema de mídia pluralista que inclua o setor privado e uma sociedade civil dinâmica.
Esses investimentos devem ser canalizados por meio de mecanismos nacionais e multilaterais comprovados e eficazes que sustentem o fornecimento de informações factuais e forneçam proteção contra influências indevidas.
Mecanismos como o Fundo Internacional para Mídias de Interesse Público demonstram como a independência e a escala podem ser combinadas para gerar um impacto global significativo, como veículos semelhantes têm feito em áreas como saúde e educação.
Em segundo lugar, os governos precisam moldar ativamente os mercados de informação de forma a promover fontes de informação independentes, pluralistas e confiáveis.
Uma ‘política industrial da informação’ é necessária para promover um ecossistema de mídia viável e independente — que incentive o dinamismo do mercado juntamente com uma regulamentação cuidadosamente gerenciada e adequada a uma economia impulsionada por IA.
Tal política deve incorporar melhor as necessidades e a supervisão públicas, que serão críticas tanto nas economias desenvolvidas quanto nas em desenvolvimento, e recompensar fatos em vez das mentiras.
Estruturas de cooperação multilateral, como a Parceria Internacional para Informação e Democracia, podem ajudar a promover a aprendizagem compartilhada e as melhores práticas em intervenções políticas.
Os primeiros sinais de progresso estão surgindo.
Em algumas semanas, os presidentes da França e de Gana sediarão uma Conferência Internacional para fortalecer a resposta à crise global de informação.
No entanto, é urgente que mais líderes se juntem a esta iniciativa.
Sem uma ação decisiva, nossos ecossistemas de informação continuarão a se deteriorar rapidamente, enfraquecendo os benefícios da revolução da IA e ameaçando tanto a prosperidade global quanto o bem-estar social.
O momento de agir é agora.
Signatários:
Prof. Daron Acemoğlu (Professor do Instituto no MIT, Prêmio Nobel de Ciências Econômicas 2024)
Prof. Philippe Aghion (Professor do Collège de France, INSEAD e London School of Economics)
Prof. Sir Tim Besley (London School of Economics)
Prof. Dra. Francesca Bria (Professora Honorária do IIPP, UCL Londres, Líder de Projeto EuroStack, Presidente do Novo Mecanismo Europeu da Bauhaus, Comissão Europeia, Presidente da Agência de Inovação ART-ER, Itália)
Prof. Dame Diane Coyle (Professora Benett de Políticas Públicas, Universidade de Cambridge)
Dr. Obiageli Ezekwesili (Presidente do Capital Humano África e Fundadora da Escola de Política, Políticas e Governança)
Prof. Mariana Mazzucato (University College London, Diretora Fundadora do Instituto de Inovação e Propósito Público da UCL)
Prof. Atif Mian (Universidade de Princeton)
Prof. Andrea Prat (Universidade de Columbia)
Dra. Vera Songwe (Presidente e Fundadora da Liquidity and Sustainability Facility)
Prof. Joseph Stiglitz, laureado com o Prêmio Nobel de Economia (Universidade de Columbia, Fundador e Co-Presidente da Iniciativa para o Diálogo Político, Economista-Chefe do Instituto Roosevelt, Prêmio Nobel de Ciências Econômicas 2001)
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