Ainda que os avanços das descobertas científicas e da revolução tecnológica da nova era sejam contínuos e impactem significativamente a sociedade, o mundo que habitamos segue sendo um lugar bastante desigual, marcado pela pobreza, pela miséria e pela fome.
É nesse contexto que é fundamental direcionar a atenção para um importante acontecimento, o 33º aniversário do Dia Internacional para a Erradicação da Pobreza, celebrado dia 17 de outubro, data estabelecida pela Assembleia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas).
A data lembra que a pobreza, mais do que uma situação de vulnerabilidade social, é uma violação de Direitos Humanos e, por isso mesmo, cobra a necessidade de ação coletiva para garantir que a dignidade humana seja protegida.
O Brasil tem avançado em importantes indicadores sociais nos últimos anos.
Com o mercado de trabalho aquecido e os programas sociais reforçados, a pobreza extrema e a desigualdade de renda chegaram, em 2024, aos menores níveis desde 2012, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
A parcela de brasileiros extremamente pobres recuou para 6,8% da população, o equivalente a 14,7 milhões de pessoas, ante 8,3% em 2023, de acordo com o FGV Social (Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas).
Esse é um resultado positivo, que mostra a eficácia das políticas de inclusão e proteção social, mas que não deve nos fazer ignorar um alerta: ainda estamos diante de uma realidade em que a pobreza persistente fragiliza os laços familiares e expõe crianças e adolescentes a riscos severos que prejudicam a sua formação como cidadãos de direito.
A perda do cuidado parental por decisão judicial é uma das consequências mais drásticas desse cenário.
Quando a pobreza compromete a capacidade de sustento, cria-se um ambiente de negligência estrutural: falta comida, moradia adequada, acesso à saúde e condições básicas para o desenvolvimento infantil.
Não se trata de irresponsabilidade ou desamor dos pais e cuidadores, mas de uma precariedade que mina a sustentação familiar e, muitas vezes, leva a Justiça a afastar crianças de seus lares.
A vulnerabilidade socioeconômica, portanto, converte-se em um fator de ruptura de vínculos afetivos, ampliando ainda mais o ciclo de exclusão social.
É preciso compreender que combater a pobreza não é apenas lutar para melhorar a qualidade de vida da população, mas assegurar que famílias possam permanecer unidas e que crianças cresçam em um ambiente seguro e protetor.
A negligência, frequentemente citada em processos judiciais, precisa ser analisada à luz das condições materiais de vida.
Quando a carência financeira é interpretada isoladamente como incapacidade de cuidado, corre-se o risco de punir famílias pela sua condição de pobreza, em vez de apoiá-las para superar as dificuldades.
Diante desse cenário, torna-se urgente pensar em políticas públicas e ações da sociedade civil que transcendam o alívio imediato da pobreza.
É necessário investir em programas de fortalecimento familiar, a fim de prevenir a separação de crianças e adolescentes de seus responsáveis.
Isso inclui o acesso à educação de qualidade, políticas habitacionais, assistência social eficaz, ações de geração de emprego e renda, além de redes de apoio comunitário, que reduzam o isolamento das famílias em situação de vulnerabilidade.
Preservar a unidade familiar deve ser um compromisso dentro da luta contra a pobreza.
Famílias fortalecidas oferecem mais proteção contra a violência, o abandono escolar, o trabalho infantil e a adultização de modo geral.
Da mesma forma, a atuação articulada entre o Poder Público, organizações sociais e outras instituições pode ampliar o alcance das iniciativas e promover uma sociedade mais justa e solidária.
A erradicação da pobreza é, portanto, o caminho para a construção de um país em que nenhuma criança seja afastada de sua família de origem apenas por falta de recursos.
É responsabilidade de todos nós garantir que a pobreza deixe de ser uma ameaça à infância e que o direito à convivência familiar e comunitária seja respeitado como pilar central do desenvolvimento humano.

Sérgio Marques é subgestor nacional da Aldeias Infantis SOS, membro do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA). Atuou como Coordenador Nacional da Convivência Familiar e Comunitária na Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
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