A incorporação dos princípios de ESG (Environmental, Social and Governance- Ambiental, Social e Governança) às políticas públicas de saúde representa um dos marcos mais promissores e, ao mesmo tempo, desafiadores da gestão contemporânea.
No Brasil, esse debate assume contornos singulares, uma vez que o Sistema Único de Saúde (SUS) não apenas reflete a complexidade das demandas sociais, ambientais e econômicas do país, mas também reúne as condições institucionais e operacionais necessárias para liderar a transição rumo a um modelo de cuidado mais sustentável, equitativo e inovador.
O componente ambiental dessa agenda, muitas vezes limitado à discussão sobre o manejo de resíduos hospitalares, deve ser compreendido de maneira mais abrangente.
A eficiência energética das unidades, o uso responsável da água, a adoção de processos de compras sustentáveis e a incorporação de tecnologias digitais que reduzem consumo de papel e deslocamentos são exemplos de práticas que traduzem o compromisso ecológico em resultados concretos.
Ao mesmo tempo, tais iniciativas produzem ganhos econômicos diretos, permitindo a realocação de recursos para a própria assistência e fortalecendo a sustentabilidade financeira do sistema.
Se no eixo ambiental, a oportunidade está na modernização dos processos, é no pilar social que reside a essência do sistema público.
Criado sob o princípio da universalidade, o SUS é, por natureza, uma política de ESG avant la lettre (antes de o termo existir), ao garantir acesso gratuito, integral e equitativo à população.
Incorporar os pilares de ESG a essa estrutura significa atualizar seus instrumentos de gestão para um tempo em que o impacto social é mensurado, a transparência é um valor estratégico e a inovação se torna indissociável da equidade.
As Organizações Sociais de Saúde (OSSs) exercem papel crucial nessa transição.
Como estruturas de governança dotadas de flexibilidade administrativa e foco em resultados, elas têm contribuído para a implementação de políticas de eficiência energética, digitalização de processos, programas de educação ambiental e incentivo à economia circular — práticas que reforçam um olhar voltado à preservação ambiental sem se afastar-se dos princípios do serviço público.
Como gerente executivo de uma OSS parceira do poder público, acredito que o cuidado com as pessoas e a responsabilidade socioambiental caminham juntos.
Foi com esse propósito que nos tornamos signatários do Pacto Global das Nações Unidas, reafirmando nosso compromisso com os Dez Princípios da ONU e com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
A presença de representantes de organizações sociais de saúde na COP 30, em Belém (PA), acompanhando os debates sobre mudanças climáticas e sustentabilidade e formalizando compromissos alinhados à agenda global, representa uma oportunidade de aprendizado e de alinhamento com as melhores práticas internacionais.
Essa participação reforça o compromisso do setor em aprimorar a gestão socioambiental na saúde pública e fortalecer as iniciativas de ESG no âmbito do SUS.
É importante lembrar que a consolidação de uma cultura ESG na saúde requer métricas robustas, indicadores transparentes e mecanismos de governança que permitam monitorar o impacto ambiental, social e econômico das intervenções.
A maturidade dessa agenda depende de sua institucionalização, o que significa incorporar o ESG como eixo estruturante dos modelos de gestão, e não como adendo reputacional.
O SUS, com sua capilaridade, diversidade de parceiros e capacidade de articulação em rede reúne condições ímpares para liderar esse movimento.
Em um país marcado por desigualdades e desafios logísticos de grande escala, o fortalecimento de práticas sustentáveis e inovadoras no sistema público pode estabelecer um novo paradigma de política de saúde.
Aquele em que cuidar das pessoas e preservar o planeta não são objetivos dissociados, mas faces complementares de uma mesma política de Estado.

João Romano é gerente executivo do CEJAM – Centro de Estudos e Pesquisas “Dr. João Amorim”
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