Ambiente acessível, material didático adaptado e corpo docente preparado para encarar as mais diversas deficiências que podem acometer o ser humano. Este é o cenário ideal quando trata-se de inclusão escolar. No entanto, em parte das instituições de ensino, esses requisitos básicos ainda não são reais e podem ter efeito reverso: a exclusão.
De acordo com dados do Censo Escolar, o número de crianças especiais matriculadas no ensino regular sobe a cada ano. Em 2014, foram mais de 698 mil novas matrículas. Santos também sente o aumento na demanda: atualmente 1078 alunos com algum tipo de deficiência estudam na rede municipal de ensino.
Para Magda Aparecida Bernardes da Silva, diretora do Unidade Municipal de Educação Especial, Maria Carmelita Proost Villaça, a inclusão escolar precisa ser bem discutida. “Os professores não estão preparados. É necessário um olhar diferenciado, se despir de preconceitos. Também é preciso olhar o indivíduo como uma pessoa que existe e tem direitos como todos nós. Não adianta só colocar a criança na escola. Precisamos ver o que a gente realmente quer com essa inclusão… Como a gente quer que essa criança saia do ensino regular”, salienta.
“Gostaríamos que a inclusão ocorresse neste sentido: onde as pessoas fossem respeitadas no seu potencial, mas que não deixasse de lado o atendimento que ele realmente necessita para desabrochar”.
Magda enfatiza que ingressar uma criança à escola vai muito além da parte cultural. “O ensino especial tem como um dos seus principais objetivos fazer com que o indivíduo crie independência”, destaca.
Dentro das salas de aula do Carmelita, por exemplo, existem banheiros para que os alunos aprendam atividades diárias, como escovar os dentes e usar o vaso sanitário. “Vemos que as crianças são muito dependentes dos seus pais. E isso não é culpa de nenhuma das partes. Cabe a nós ensiná-los algumas atividades do dia a dia”, ressalta.
O deficiente visual Romilson Allison Feliciano do Nascimento, de 29 anos, conta que estudou no Lar das Moças Cegas — uma das 13 entidades conveniadas com a Prefeitura de Santos — até 2013. “Comecei a estudar aos 12 anos. Aprendi braile, atividades da vida diária e até mesmo a tomar banho sozinho na escola”, diz. “Posso dizer que sou independente, mas é uma independência relativa. Seria mentira se eu disser que é absoluta”.
Desde 2012, Romilson começou uma nova etapa no ensino superior e cursa Jornalismo na Universidade Santa Cecília (Unisanta). Ele elogia a postura da instituição quanto à inclusão. “Os professores estão cada vez mais preparados. Quando entrei na faculdade, eles não sabiam bem como lidar, mas sempre tiveram interesse”.
Para ele, apenas trabalhando com alunos com algum tipo de deficiência a rede de ensino vai conhecer as reais necessidades do deficiente e se adaptar. “Quando entrei, solicitei o piso tátil no pátio da universidade e eles colocaram. Aos poucos, a instituição fica mais acessível, pois ela aprende com o próprio deficiente”, finaliza.
Futuro próximo
Théo tem apenas um ano e meio, mas a preocupação sobre sua futura vida escolar já se faz presente. Sua mãe, a psicóloga infantil Luana Rezende – que parou de exercer a profissão para cuidar de Théo, que tem paralisia cerebral e síndrome de West -, acredita que uma série de fatores precisam ser modificados nas escolas regulares para que a inclusão realmente aconteça. “Não posso generalizar, mas vejo que as escolas e os professores não estão preparados para receber crianças especiais”, diz.
Luana, assim como muitas outras mães de crianças com algum tipo de deficiência, temem esta importante e necessária etapa. “O que vai ser oferecido para o meu filho? Não quero que ele fique excluído em um canto, que não seja tratado bem ou que seja considerado como um estorvo pelas professoras. Quero que ele seja visto como uma criança com necessidades especiais, mas que precisa de um olhar mais atencioso”, ressalta. “Só quem trabalha ou tem um filho deficiente sabe a dificuldade que é a inclusão. Não apenas nas escolas, mas também na sociedade”.
Mesmo diante destas constatações, Luana acredita que incluir futuramente o pequeno Théo em uma escola de ensino regular é fundamental para o seu desenvolvimento, principalmente por conta da interação com outras crianças. “Acredito que fará um bem maior para ele estar em uma escola regular do que em uma especial. As terapeutas dizem que ele tem capacidade para frequentar uma escola normal. Não pela deficiência dele ser leve, pois não é. O Théo tem sequelas motoras muito graves. As cognitivas a gente ainda não sabe”, conta.
Rotina comum
“O dia a dia dele na escola é como os dos demais alunos. Ele assiste as aulas, participa de projetos e tudo relativo a isso”, conta Isabela Raccioppi, irmã mais velha do Pedro, de 14 anos, que tem Síndrome de Down, e estuda no colégio Stella Maris desde os três anos. “O conteúdo é passado de uma maneira diferente para ele. De uma forma um pouco mais simplificada”, explica. Para isso, Pedro conta com uma professora que trabalha diretamente com ele.
Isabela destaca que seu irmão se dá bem com todos da escola e que este sentimento é recíproco. “Alguns colegas estão na mesma classe desde os três anos de idade e isso acaba fazendo que o vínculo seja formado”, diz.
Para Eduardo, pai do Pedro, incluí-lo em um colégio de ensino regular desde a infância trouxe bons resultados em seu desenvolvimento. “A convivência dele com outras crianças é importante para ele e também para os outros. Vejo que os amigos dele têm uma cabeça diferente. Eles aprenderam a aceitar as diferenças e isso ajudará ainda mais nas gerações futuras”, diz.
A família considera o Stella Maris uma instituição altamente preparada para a inclusão. “Lá existem outras crianças e eles atuam com o mesmo preparo e carinho com o Pedro. Eu fico muito feliz!”, diz Eduardo.
Além da escola, durante o período da tarde, ele faz outras atividades que contribuem para o seu desenvolvimento, como sessões com fonoaudiólogo, com uma psicomotricista, e natação. Também fez aulas de violão por um tempo, mas depois cansou. Todo dia ele tem uma atividade diferente.
“Não adianta eu preparar o meu filho para o mundo se o mundo não está preparado para ele”. Esta frase é da fundadora do projeto Inclusivamente, Viviane Reis, de 45 anos. A necessidade de informações verdadeiras e de acabar com os preconceitos pela falta de conhecimento foram fatores estimulantes para o investimento neste projeto.
Viviane é mãe do João Pedro, de 9 anos, e da Maria Clara, de 7 anos, que tem Síndrome de Down. Antes mesmo do nascimento da filha, ela percebeu que era necessário desconstruir alguns conceitos pré-estabelecidos sobre os deficientes.
“Notei que havia muita informação equivocada em diversas áreas e que era necessário fazer algo para mudar isso”, conta. A partir deste momento, Vivi, como é conhecida, decidiu iniciar o Inclusivamente.
Como está escrito no Facebook, o projeto nasceu da vontade de ver todas as pessoas incluídas em uma sociedade mais justa e feliz.
“Aceitar não é incluir. Incluir é quando você enxerga a criança. A inclusão não é benéfica apenas para quem tem a deficiência, mas essencialmente para os outros”, destaca.
Por meio do Inclusivamente, Vivi realiza palestras e cursos para gerar reflexão sobre o tema. Recentemente, o projeto começou a criar jogos de tabuleiros pedagógicos voltado às pessoas especiais.

