Com a definição da vencedora da licitação para a construção e operação do túnel Santos-Guarujá, a empresa portuguesa Mota Engil, na semana passada, o sonho da construção da ligação seca entre Santos e Guarujá está mais próximo.
No entanto, para moradores das áreas afetadas pelas desapropriações que ocorrerão em Santos e Guarujá, a preocupação é que, para eles, esta realidade se torne um pesadelo – a despeito das promessas, abraços e beijos das autoridades recebidos pelos que estavam presentes durante o leilão na última sexta (5) na B3, na Capital.
Afinal, moradores do bairro do Macuco, em Santos, demonstram preocupação com os impactos que a obra trará para a comunidade, pois ainda não houve a definição do traçado do túnel – a ser decidida pela empresa vencedora.
Traçado
Algumas propostas terão mais chances de sucesso: o projeto de uma superquadra envolvendo a Rua José do Patrocínio e a Avenida Conselheiro Rodrigues Alves, da Avenida Senador Dantas até a Rua Almirante Tamandaré, isolando toda a área da obra e acesso ao túnel.

Foto: Divulgação
Assim como, existe o projeto da Dersa, concluído em 2015, com o trajeto iniciando pela Rua Padre Anchieta.

Foto: Divulgação
Empreendimento
Já quanto ao novo empreendimento Santos AE, ele será construído pela Companhia de Desenvolvimento Urbano a Habitação (CDHU). Ao todo, estão previstas 1.769 unidades, sendo 762 unidades de Habitação de Interesse Social (HIS).
Elas destinam-se a famílias com renda de até seis salários mínimos. (R$ 9.108). Outras 1.007 unidades de Habitação de Mercado Popular (HMP), que admitem renda familiar de até dez salários mínimos. (R$ 15.180,00). Além de comércio, serviços e equipamentos públicos.
De propriedade da CPTM – Companhia Paulista de Trens Metropolitanos, a área tem 27,5 mil m2 – o equivalente a três campos de futebol de tamanho oficial. O local fica ao lado da estação Porto do VLT, onde está um terminal alfandegado.

Foto: Nando Santos
Desapropriações
Desse modo, durante o leilão do túnel, o governador de SP, Tarcísio de Freitas comentou com os moradores presentes no evento sobre a desapropriação de imóveis no bairro. “Eu não vou deixar vocês desamparados. Vamos dar a melhor solução para vocês e vocês não irão se arrepender”.
Segundo o secretário da Associação Comunitária do Macuco (Acom), José Santaella, as desapropriações no Macuco são discutidas desde a retomada do projeto em 2023 sendo que o projeto Dersa lançado em 2013 impactava cerca de 200 propriedades.
“Agora, após a audiência ambiental, foi de consenso uma solução de que seriam 65. Então, estamos preocupados com isso. O túnel está desapropriando, tirando pessoas, vidas, moradias e negócios daquele local. Eu acho que o túnel vai impactar e o conjunto habitacional futuro trará à população que permanecer um novo bairro”, disse.
Impactos
Segundo a presidente da Acom, Alcione Alves, o que os moradores mais sentem de impacto são na questão de saúde, pois são pessoas idosas, em sua maioria, que nasceram e vivem no bairro até hoje.
Ela acrescenta que as autoridades sempre mencionam que estão ao lado dos moradores, mas a comunidade sabe que não se pode confiar. “Eles falam que são 65 moradias, porém fizeram a contagem por drone. Na verdade, eles contam cada telhado como uma edificação. Mas não é assim, porque do meu lado, por exemplo, tanto do lado direito e esquerdo, são famílias que nasceram aqui”.
“Assim, os irmãos tiveram filhos. Os filhos continuam morando e cada um foi construindo uma casa. De um lado, são quatro casas a mais e do outro, cinco. Isso eles não enxergam e a pessoa não tem garantia nenhuma do que vai acontecer”, critica. “Portanto, se você parar para pensar nessas 65 edificações que falam, são muito mais. Deve chegar próximo de 130, 150, entre casas, comércios e empresas.”
Santaella aborda que a Acom está focada em debater sobre o problema de desapropriação, como será feito, avaliado e como será pago. A previsão é que R$ 544,2 milhões destinem-se às indenizações nas áreas afetadas em ambas as cidades.
Moradias
A proposta do novo empreendimento prevê 1.769 unidades, sendo 762 unidades de HIS. Contudo, a outra dúvida é se os moradores estão interessados ou dispostos a se mudar para essas unidades. Segundo Santaella, os moradores que moram em casa não querem isso. “Quem mora num terreno de 300 m², 400 m², não possui interesse em se mudar”.
“Você mora numa casa, você não quer ganhar um condomínio, um apartamento de 50 m². Isso está fora de propósito. Para alguns que talvez sejam locatários, pode ser uma solução. Contudo, os moradores não entendem que isso é uma solução. As soluções negociadas com o Estado implicam em várias opções como por exemplo, troca de casa por casa, amparo na aquisição de outro imóvel e indenização aos empresários que forem compelidos à mudança. Logo, ir para o futuro complexo CDHU não é para atender a população do Macuco essencialmente afetada. Talvez sirva à população do Guarujá”, disse Santaella.
Além disso, Alcione menciona que nenhum dos moradores deseja morar em CDHU. “Não é normal um ser humano pensar que você vai sair de uma casa enorme para viver em um apartamento de dois, três quartos que seja. Isso é uma coisa que a pessoa não aceita, são pessoas idosas, com mais de 80 anos e até 90 anos. Pessoas que não aceitam e não entendem”.
Morador
Quem confirma essa percepção é o morador Gilmar Alvares que vive no Macuco há 65 anos. De acordo com ele, a obra do túnel já está causando impactos mesmo antes de começar aos moradores. “A desapropriação seria diretamente na nossa rua (Rua José do Patrocínio) e se espalharia pelo entorno da rua e adjacências. O impacto é totalmente negativo, porque aqui é um bairro antigo e tem várias casas que não conseguimos fazer uma reforma. Desde 2012, quando surgiu a primeira oportunidade de se fazer aqui com o projeto da extinta Dersa. De lá para cá, estamos parados no tempo. As casas estão se deteriorando. É um impacto muito ruim que está causando”.

Moradores do Macuco, Gilmar Alvares, da esquerda para direita, sua mãe Lucinda Alvares, tia Luzia Alvares e sua prima Matilde Alvares. Foto: Nando Santos
Ele também se posiciona sobre como observa a possibilidade de desapropriação do seu imóvel. “Eles estão convictos de que irá haver a desapropriação, porém não se fala qual será o projeto. Foram diversos para fazer o túnel”. Conforme ele, o mais citado é o da superquadra, com, a princípio, 65 moradias afetadas. “Se for esta a proposta, o impacto será maior, porque onde nós moramos. O terreno pertence a seis famílias. É um terreno herdado dos nossos avós onde foi construída uma casa dentro desse terreno para cada um dos filhos. Hoje esses filhos tem netos, bisnetos morando por aqui”.

Rua José do Patrocínio. Foto: Nando Santos
Mudança
Alvares também comenta se ele aceitaria essa mudança do seu imóvel para um outro local. “É difícil responder essa pergunta, porque nós não temos qualquer segurança. Minha mãe está com 88 anos. Ela nasceu aqui, pois nossa casa tem 90 anos. É difícil saber e dar uma posição certa. Se nós ficaríamos satisfeitos de ter que mudar para uma unidade do CDHU ou algo do tipo, porque nós fomos bem claros: para a maioria das pessoas que são proprietárias desejam ficar e continuar em uma casa”.
“E o que foi falado é para nós ficarmos tranquilos, porque se isso acontecer, nós vamos sair para uma casa igual ou melhor a que nós estamos morando”, explica.
Governo de SP
Segundo o Governo do Estado de São Paulo, por meio da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), as famílias diretamente afetadas pelas obras do túnel Santos-Guarujá terão prioridade no futuro empreendimento.
No entanto, o novo empreendimento, que contará com mais de 1,7 mil unidades, beneficiará muito mais famílias, em duas modalidades: Habitação de Interesse Social (HIS), voltada a famílias de até cinco salários mínimos, em demanda a ser indicada pela Prefeitura; e Habitação de Mercado Popular (HMP), acessível à população de até de salários mínimos, conforme previsto na política habitacional do Estado.
Com isso, o empreendimento poderá atender tanto os moradores impactados quanto outras famílias santistas.
O projeto também prevê a inclusão de equipamentos sociais, como o programa Vida Longa – destinado a idosos autônomos –, além de espaços verdes, áreas de convivência e infraestrutura de serviços públicos, como uma praça de cidadania, promovendo um ambiente urbano completo e integrado.
Ainda não há definição dos valores de investimento, pois o edital está em fase de concorrência pública, com prazo de 45 dias úteis. A licitação será realizada por meio de disputa fechada, utilizando o critério de menor preço. Somente após a abertura das propostas será possível estimar os custos totais. A desocupação da área será feita de maneira planejada, com base nos trâmites legais e diálogo com todas as partes envolvidas, garantindo segurança jurídica e social.
O cronograma completo de desocupação e início das obras será definido em conjunto com a empresa vencedora da licitação.
Prefeitura de Santos
Além disso, a Prefeitura de Santos, por meio da Cohab-Santista e das demais secretarias envolvidas informa que mantém diálogo permanente com a CDHU e, oportunamente, quando ocorrer a entrada do projeto no Executivo, serão analisadas as soluções urbanísticas que envolvem a esfera municipal.
Eudmarco
O Boqnews contatou a empresa Eudmarco, por meio de sua assessoria de Comunicação, para um posicionamento sobre o futuro empreendimento que será erguido em área da CPTM, hoje alugada à Eudmarco, mas a empresa optou em não se manifestar sobre o assunto.
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