Escrevi, há quase dois anos,
sobre a doença que havia derrubado uma moça que tanto admirava. Mais do que uma
aventura de verão, era uma moça com quem mantive um relacionamento de quase
quatro anos, uma história que sobrevivera às separações, reencontros,
distâncias e crises. Amor, mesmo!
Neste ano, a doença dela se agravou. Os tratamentos
falharam. Os médicos se mostraram charlatães vestidos de branco. Os remédios,
muitos de alto custo, pareciam placebo, aspirinas diante de um tumor em crescimento.
Muitos
familiares se voltaram para outros compromissos, em parte para amenizar a dor
de testemunhar a agonia pública dela, outros porque entendiam que a morte
tocara a campainha. Até as rivais a olhavam com misericórdia. Preferiam vê-la
viva. Optaram por trancar no armário as mágoas antigas. Seria desumano
ressuscitar velhas rusgas com alguém incapaz de se defender, com alguém que
colecionava sucessivas derrotas.
Os
vizinhos se calaram. Muitos ajudaram no passado recente, mas possuem seus
próprios problemas, e entenderam que a moça estava condenada. Aguardavam em
silêncio a data do velório.
Como
escrevi aqui, a moça sempre foi independente. Viveu, há nove anos, o apogeu
profissional. Era respeitada no trabalho, suas decisões eram ouvidas até pelos
medalhões do ofício. Era, acima de tudo, cortejada por propostas de novos ares.
Muitos de seus assistentes foram seduzidos por empregos (e salários) melhores e
foram se desenvolver em outras bandas.
A
moça portuguesa me dizia, na época, que não poderia se chatear com isso. O trabalho
dela envolvia também abrir caminho para gente com espírito aventureiro. Nenhum
deles, como manda a cartilha perversa do mercado, retornou para socorrê-la
quando a doença a esmagou. Apenas lamentam, conversam entre si de vez em
quando, mas o telefone seguiu emudecido.
A
doença começou a se manifestar, a olhos vistos, há quatro anos. O rosto entrou
em deformação. O corpo não era mais cobiçado pelos que a conheciam no caminhar
pelas calçadas. A moça se arrastava como o corcunda, à procura das sombras na
catedral francesa.
Como
acontece com muitos pacientes de UTI, ela entrou ano passado na etapa de
recuperação rápida. Deu sinais de que a doença poderia regredir. Uma equipe
médica a acompanhava com dedicação. Uma mistura de gente nova, com veteranos da
profissão. A moça acreditou que poderia receber alta ou, pelo menos, se
aproximar de uma rotina dita normal.
No
final do ano passado, um erro de dosagem de medicamento provocou uma recaída. A
moça portuguesa não subiria de andar no hospital. Deveria ficar internada mais
uns tempos. Foi a sentença. Faltou dinheiro. A equipe médica rachou ao meio.
Muitos foram embora, outros se aposentaram tamanha a decepção. Ela caiu, este
ano, em um quadro depressivo, não detectado de saída. Confundiu-se melancolia
com enfermidade psicológica.
A
Portuguesa Santista teve, em 2012, o pior ano de sua história. O fantasma do
fechamento de portas nunca foi tão concreto. Na quarta e última divisão do
Campeonato Paulista, a Briosa parecia um soldado desarmado e ajoelhado na
trincheira. O clube ficou em penúltimo lugar, entre 41 times. Jogou dez
partidas. Não ganhou nenhuma. Três empates e sete derrotas.
Mesmo desenganada, a Portuguesa pode se levantar
em 2013. O grupo que levou o São Vicente ao vice-campeonato e à ascensão à
Terceira Divisão depois de oito anos assumiu a Briosa. É uma nova equipe médica
que, espero, aplique o tratamento adequado para salvar esta moça, iludida e
magoada com os que prometeram acolhê-la nos últimos anos.
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