A “República dos Excluídos” que o Brasil precisa libertar da miséria | Boqnews

Opiniões

29 DE JULHO DE 2025

A “República dos Excluídos” que o Brasil precisa libertar da miséria

Eduardo Capobianco

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Embora seja uma prioridade máxima erradicar a pobreza no Brasil, persistem muitas dúvidas quanto às políticas públicas mais eficazes para a conquista dessa meta.

Desde a promulgação da Constituição de 1988, parte relevante do orçamento estatal tem sido destinada, de modo correto, à educação e à saúde, com impacto positivo sobre os segmentos mais carentes da população.

Outra vertente é a distribuição direta de renda, como no programa Bolsa Família, que é um justo socorro, mas não pode ser um meio perene de subsistência das pessoas e famílias.

O que seria medida excepcional tornou-se regra, ampliada pela lógica assistencialista e eleitoreira dos governos de distintos partidos.

Em 2022, ano eleitoral, o benefício foi duplicado, com o intuito e na esperança de favorecer os candidatos. Ademais, variações desse projeto espalham-se por estados e municípios.

O orçamento do Governo Federal para o exercício de 2024 revelou com clareza a distribuição dos recursos assistencialistas: R$ 168,2 bilhões ao Bolsa Família, pago a 44,4% das famílias brasileiras; R$ 111,1 bilhões ao Benefício de Prestação Continuada; e R$ 3,5 bilhões ao Auxílio Gás.

O total do dinheiro despendido foi de R$ 282,8 bilhões, contra apenas R$ 62,2 bilhões em investimentos públicos em infraestrutura.

O assistencialismo solidifica a pobreza. O mais grave, porém, é que não acaba com ela, como deveria ser o objetivo de uma política pública eficaz de caráter social.

Esse modelo de distribuição direta de renda implementado no Brasil é permeado por fortes distorções, a começar pelo fato de o programa ter porta de entrada, mas não de saída, pois apenas provê dinheiro às pessoas, sem oferecer alternativas de ingresso no mercado de trabalho ou em outra atividade que permita a independência dos beneficiários.

Paradoxalmente, persiste no País falta mão de obra em vários setores de atividade.

Além disso, parte dos recursos aplicados nessa política pública é gasta pelos beneficiários nos cassinos virtuais. Segundo o Banco Central, as bets abocanharam R$ 3 bilhões do Bolsa Família em agosto de 2024, 21% dos valores transferidos às famílias naquele mês. É o “Bolsa Aposta”.

Os valores distribuídos, por não advirem do trabalho, não elevam a produção e geram inflação.

Para contê-la, aumentam-se os juros, que seguem muito altos, agravando o “Custo Brasil”, ao lado de impostos e encargos trabalhistas exagerados, insegurança jurídica e gargalos logísticos.

Tais ônus têm, há décadas, desestimulado o investimento produtivo, impedindo o aumento da produção, tornando mais atrativo aplicar recursos no mercado financeiro e favorecendo a especulação, que não gera emprego, renda e desenvolvimento.

Além disso, a política assistencialista agrava o já elevado rombo fiscal acumulado ao longo de décadas.

Visando reduzi-lo, a prática de sucessivos governos tem se baseado na mesmice de transferir cada vez mais ao Estado o dinheiro dos setores produtivos e da sociedade, via impostos e taxas, como se observa com o recente aumento do IOF, cuja revisão é tema de discussão entre Executivo, Legislativo e setor privado.

Com as contas públicas pressionadas, os investimentos em infraestrutura – que multiplicam renda, contribuem para o aumento da produtividade e proporcionam mais bem-estar à população – são cada vez mais transferidos para o setor privado, diretamente impactado pela elevação do custo de capital.

Em 2024, dos R$ 259,3 bilhões aplicados, R$ 197,1 bilhões tiveram origem na iniciativa particular.

O mais grave é que a taxa total de investimentos produtivos no Brasil é hoje de 17% do PIB, mas seriam necessários ao menos 24% para ascendermos da condição de país de renda média à alta.

A China, por exemplo, manteve cerca de 36% entre 1952 e 2021, chegando a 43% naquele último ano.

Resultado: centenas de milhões saíram da miséria e a nação asiática tornou-se detentora do segundo maior PIB global.

Devido ao desestímulo ao investimento, vai sendo criado consenso entre os economistas que o Brasil pode crescer no máximo 2% ao ano para não comprometer o controle da inflação.

A impossibilidade de promover aumento mais expressivo do PIB é uma absurda contradição num país que ainda tem cerca de 60 milhões de habitantes na faixa da pobreza (IBGE/2023).

Esta nossa “República dos Excluídos” equivale a toda a população da Itália, a quinta maior da Europa. Portanto, precisamos gerar empregos em grande escala e transformar o trabalho digno no principal fator de justiça social e distribuição de renda, metas que defendo com ênfase.

Porém, estamos desmontando nossa força produtiva, aposentando precocemente trabalhadores e empreendedores e criando uma base econômica insustentável.

No fim, numa triste ironia, os mais prejudicados são justamente aqueles que as políticas assistencialistas pretendem proteger.

 

Eduardo Capobianco é vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) e CEO da Agis.

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