A célebre indagação de Cícero ao Senado Romano, “Quousque tandem abutere, Catilina, patientia nostra?” (Até quando, Catilina, abusarás da nossa paciência?), nunca soou tão atual e necessária no cenário brasileiro.
O que assistimos hoje não é apenas uma crise institucional passageira, mas o ápice de uma decomposição moral que emana da cúpula do Poder Judiciário.
O Supremo Tribunal Federal (STF), que deveria ser o bastião da Constituição e o refúgio da sobriedade democrática, transformou-se em um epicentro de desavenças, vaidades e, tragicamente, de uma depravação de costumes que choca a nação.
A promiscuidade exibida entre membros da alta corte, banqueiros e políticos de índole questionável não é apenas um deslize ético; é uma afronta direta ao cidadão comum que ainda acredita no império da lei.
Quando ministros se envolvem em bate-bocas públicos, trocando acusações que variam de desonestidade intelectual a chantagens de bastidores, a liturgia do cargo é assassinada em praça pública.
O ambiente tóxico que se instalou nos gabinetes de Brasília não fica restrito ao Planalto Central; ele escorre pelas instituições, contamina as relações sociais e projeta uma imagem de “república de bananas” perante a comunidade internacional.
A gravidade da situação reside na perda total da decência.
O relato de desonestidade intelectual dentro dos próprios gabinetes sugere que a interpretação da lei se tornou um joguete de interesses pessoais e políticos, e não um exercício de busca pela justiça. Essa podridão, como bem define o sentimento popular, agride a consciência de quem ainda possui valores morais sólidos.
O mais doloroso é perceber que esses títeres imorais parecem ter perdido a capacidade de sentir vergonha.
Eles agem como se estivessem acima de qualquer escrutínio, ignorando que o exemplo que dão hoje é o veneno que nossos filhos beberão amanhã.
Quando o guardião da lei se torna o seu maior transgressor moral, o contrato social é rompido.
O sistema, esticado ao seu limite máximo pela arrogância e pela impunidade, dá sinais claros de que pode explodir a qualquer momento.
No entanto, é precisamente nesse cenário de terra arrasada que reside a semente de uma nova esperança.
A história nos ensina que sistemas apodrecidos costumam ruir sob o peso da própria imoralidade, abrindo espaço para que algo novo e mais íntegro possa florescer.
A reação, entretanto, não pode ser passiva. Não se trata de incitar a violência, mas de exigir uma depuração profunda.
Que cada brasileiro reaja como puder: através do voto consciente, da pressão popular, da denúncia constante e da educação das novas gerações.
Antes que tudo “vá pelos ares”, é preciso que a sociedade civil retome o protagonismo moral do país.
A hora dessa gente vai chegar, não por um ato de vingança, mas pela força inevitável da justiça histórica que não tolera a depravação eterna.
Precisamos de um STF que volte a ser técnico, silencioso e respeitável.
Um tribunal que não precise de holofotes, mas de integridade.
Até que esse dia chegue, a pergunta de Cícero continuará ecoando em nossas mentes, servindo como um lembrete de que a paciência de um povo tem limite e que a esperança de um novo Brasil depende da coragem de enfrentar a podridão que hoje nos governa das sombras das togas.

Marcos Cintra é doutor em Economia por Harvard e professor titular da Fundação Getúlio Vargas. Foi Vereador, Deputado Federal, Secretário Especial da Receita Federal do Brasil do Ministério da Economia, Presidente da Financiadora de Estudos e Projetos (FINEP), Secretário do Planejamento do Município de São Paulo, Secretário de Finanças do Município de São Bernardo do Campo, Secretário do Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Município de São Paulo e Subsecretário de Ciência, Tecnologia e Inovação do Estado de São Paulo.
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