Parte considerável dos detentores de autoridade transitória, aquela que vem com cargos públicos, quer aplausos e reverências.
Encontram sempre um grupo de áulicos, ávidos por satisfazer o chefe em todas as suas vontades.
Por isso é que a crítica é uma experiência excepcional na vida do poderoso.
Ele se acostuma com a corte. Quando ela falta, ele nem sempre reage bem.
Isso aconteceu no decorrer da História e continua a ocorrer.
O fanatismo envolveu Hitler, Mussolini, Franco, Salazar e tantos outros. Falo apenas dos mortos, para não suscitar ruídos.
Conta-se que, principalmente na Alemanha e na Itália, não se podia abordar qualquer mácula no regime nazista ou fascista.
Nada, no ideário de ambos, seria censurável.
O princípio era de absoluto êxtase, só se permitiam manifestações laudatórias aos chefes.
Certa feita, o Duce – Benito Mussolini – fazia uma viagem pelo interior e, nas vizinhanças de um povoado, deu-se uma pane em seu carro.
O conserto demoraria cerca de duas horas.
O motorista aconselhou-o a permanecer dentro do cinema da aldeia.
Ele aceitou e entrou na sala de projeções, repleta. No escuro, incógnito, sentou-se em um dos últimos bancos.
Em dado momento, exibe-se o noticiário em que a única figura a merecer espaço era o próprio Mussolini.
A grande assistência, como impelida por um controle automático, irrompeu em aplauso.
Todos de pé, exaltados, em frenética gritaria orquestrada.
Benito deixou-se ficar sentado e quedo. Fruía daquele instante de glória.
Terminado o espetáculo, um idoso dirigiu-se discretamente a ele: – “O senhor é imprudente! Eu também penso como o senhor em relação a Mussolini. Mas é muito perigoso não acompanhar os outros quando ele aparece, mesmo na tela. Aceite meu conselho: não faça mais o que fez agora. Pode-se arrepender!”.
É assim que funciona. Os ouvidos ficam treinados para a melodia encomiástica.
Um tom menos elogioso pode ofender a sensibilidade de quem se acostumou com a música da vassalagem.
Guarde para você a sua opinião, se não coincidir com o catecismo da bajulação.
José Renato Nalini é reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e secretário-executivo das Mudanças Climáticas de São Paulo.
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