No futebol de hoje, clubes liberam jogadores cada vez mais cedo para o exterior, especialmente para Europa e Ásia. Com isso, torna-se necessário à equipe ter uma base consistente, tanto para que o time não perca qualidade quando esses atletas forem lançados ao time profissional, como para a posterior venda desses jogadores por boas quantias, sonhando, inclusive, com uma nova negociação, ainda mais lucrativa, para abocanhar uma porcentagem da qual o clube formador tem direito, segundo a FIFA.
Nunca se falou tanto na valorização do futebol de base. Tanto que, ano após ano, a Copa São Paulo de Futebol Junior vira reduto de empresários, de olho em garotos que nem bem chegaram à maioridade e já podem ser seduzidos pela possibilidade de atuar em um grande clube, seja do Brasil ou do exterior. No entanto, vêm à tona questionamentos que tratam da real preparação técnica e psicológica do jovem atleta, especialmente daquele que é visto como uma grande promessa.
E ainda nesse aspecto, como saber se aquele garoto tende a ser um jogador de qualidade? Perguntas essas que pairam na mente de profissionais da área, pais e torcedores para saber se o menino, de fato, “leva jeito para a coisa…”.
Do ponto de vista técnico, o colunista do site Olheiros, especializado em categorias de base, Pedro Venâncio relembra que, no livro O Universo Tático do Futebol, do treinador e atual coordenador das categorias inferiores do Atlético-PR, Ricardo Drubscky, uma das primeiras análises vem justamente da experiência que o garoto tem de base. “Ele (Drubscky) diz que hoje em dia é muito difícil alguém chegar aos 16 anos como um anônimo no futebol, por causa da rede de informações que existe. Um menino nascido em 1993 que chega em um clube sem ter passado por qualquer outro antes já é olhado com desconfiança”, explica.
As avaliações seguintes provêm da observação propriamente dita. Segundo o supervisor de futebol de base do Santos, Abel Verônico, essas análises começam no período em que o jogador chega ao clube ou à nova categoria para ver se ele tem condições de prosseguir no elenco. “Além dos treinos, acompanha-se o atleta em jogos amistosos e torneios não-federados, para se ter idéia da movimentação e da habilidade. E podem ocorrer, inclusive, mudanças de posição, se o treinador julgar que, por ter determinada estatura ou estrutura física, o jogador pode render melhor em outro setor. Tivemos atletas que se destacaram assim”, lembra.
As características notadas mudam de uma posição para outra. E quanto a isso, Abel explica que o rigor é fundamental. “Um rapaz que chega ao time júnior (sub-20) com 1,80 de altura, pode até ser muito bom debaixo da trave, mas não tem como ser goleiro de uma equipe profissional. São raros os goleiros baixos. Para zagueiro, a mesma coisa. Se não tiver boa estatura, dificilmente rende na posição, por mais determinado que seja. Não dá para sonhar muito”, destaca.
Goleador
No setor ofensivo, as características também são bem determinadas. O atacante, por exemplo, na visão do supervisor de futebol de base do Peixe, deve ser sempre goleador, mesmo que seja limitado tecnicamente. “Ele basicamente tem que saber como mandar a bola na rede. Pode não ser um primor no domínio de bola, mas se souber como chutá-la e marcar gols, é ele quem ganha a oportunidade”, destaca.
E é no período de testes que começa a se analisar outro comportamento do jogador: o extra-campo. Para Abel, trata-se de uma circunstância em que o treinador deve se mostrar extremamente confiável, para que o atleta possa se atentar aos avisos e manter uma conduta mais adulta. E isso não inclui, a seu ver, barrar o garoto de um jogo. “Cabe ao técnico, se ver o atleta ter uma atitude que não é legal, sentar e conversar. Não se pode mentir, e se o jogador é bom, isso deve ser sempre lembrado.
Porém, é necessário dar o alerta. Se ele for bom, não deve tirá-lo da equipe titular e colocar um outro mais fraco por causa disso, prejudicando o resto do time”, enfatiza.
Psicologia
Com isso, vem à tona outra preocupação, que, embora ainda obtenha pouca atenção por parte dos dirigentes brasileiros: a área psicológica pode colaborar com o amadurecimento do atleta como um futuro profissional e homem. De acordo com a psicóloga do Santos, Sandra Román, esse desenvolvimento é proporcional às crenças internas do jogador. “Tudo é condicionado pelos pais, pelas boas e más pessoas que estão por perto e pelo ambiente de trabalho. Até por isso a questão da Psicologia é tão importante no crescimento de um jovem atleta”, pondera.
As discussões sobre a importância de uma análise além dos gramados crescem quando entram em questão os jogadores considerados “promessas”, ou seja, aqueles cujos olhares são mais apurados, devido à evidente habilidade e fácil domínio de bola. É justamente esse olhar que aflige Sônia.
“Com 10 ou 12 anos, a criança que já é muito valorizada e ganha bem, pode receber uma imagem errada da situação, desenvolvendo uma característica narcisista. Acaba sendo comum você ouvir, em briguinhas internas, um dizer que o outro ‘não é nada’, ou comparar os ganhos mensais. Isso tudo pode estragar o futebol de um menino e, de maneira geral, até do próprio time”, alerta.
Receita
Obviamente, o sucesso de um jovem garoto no futebol não depende somente das condições externas, mas estas são de grande utilidade. Na visão da psicóloga do Santos, uma parte da “receita” deve ser iniciada pelos próprios pais. “Não é incomum o pai de um garoto de 10 anos cobrar o filho, de maneira até agressiva nas palavras, por um chute ruim ou um drible errado. O garoto ainda não está amadurecido e essa cobrança excessiva é prejudicial”, alerta.
Há também a questão de pais que residem próximos ao local de treino com os filhos, especialmente os considerados “promessas”, ficando perto de onde está toda a diretoria do clube.
“Isso é ruim, pois causa uma distinção entre aquele atleta e os companheiros. O primeiro passo para que esses meninos cresçam é que eles estejam em pé de igualdade com os demais colegas, de forma a dificultar possíveis intrigas”, defende Sônia.
Já dentro de campo, Abel recomenda que não se reprima a iniciativa do atleta. “Diego e Robinho cresceram porque era dada a liberdade para que eles partissem para cima. Não se pode dizer a um jovem com esse potencial para ficar tocando a bola, quando sua característica é outra.
Claro que, quando há exageros e firulas, aí sim deve-se chamar a atenção, avisar que o futebol é uma coisa séria, para evitar que o atleta abuse de sua habilidade novamente”.
30 DE JANEIRO DE 2009
Investimento no futuro
No futebol de hoje, clubes liberam jogadores cada vez mais cedo para o exterior, especialmente para Europa e Ásia. Com isso, torna-se necessário à equipe ter uma base consistente, tanto para que o time não perca qualidade quando esses atletas forem lançados ao time profissional, como para a posterior venda desses jogadores por boas quantias, […]