La Masia, De Toekomst, Alcochete. Tratam-se de três das mais tradicionais academias de formação de talentos do futebol, responsáveis por fazer Barcelona (ESP), Ajax (HOL) e Sporting (POR), respectivamente, potências na revelação de jogadores. No caso do Santos, a tradição não está na estrutura, mas em uma história na qual garotos fazem a diferença desde os mais tenros anos, como provam Arnaldo Silveira e Araken — muito antes de se pensar em Pelé, Coutinho, Pita, Juary, Robinho, Diego, Neymar ou Ganso. Não à toa, o lema do Centenário do Peixe, comemorado neste sábado (14), é Meninos Para Sempre.
Mas que “magia” faz do Santos ser o clube no qual afloram tantos artistas da bola — e o principal, artistas que vingam? “Depois de um jogo contra o sub-15 do São Paulo, no ano passado, o técnico deles perguntou: como esses meninos só aparecem no Santos?“, lembra o hoje técnico do sub-17 do Peixe, Emerson Ballio. Para os santistas, não há mágica, mas oportunidade. “Esse é o grande atrativo que traz a garotada para cá. Se não for dada a chance ao garoto, ele não vai vingar. E essa paciência é um diferencial do Santos. É algo cultural, que começou lá atrás”, analisa Luiz Fernando Moraes, gerente da base do clube.
Juniores treinam no gramado sintético do CT Meninos da Vila. Daí é que vão sair os candidatos a sucessão de Neymar. Foto: Lincoln Chaves |
Paciência
Quem confirma essa tradição é “só” a maior jóia já revelada na Vila Belmiro: Pelé. “Na minha época, você ainda não tinha as categorias de base da forma específica que a gente vê agora, mas já naquela ocasião o Santos fazia um trabalho muito bom. Tanto é que o Valdemar de Brito (considerado o “descobridor” do Rei), quando me trouxe para cá, era porque o Santos já era um time que estava trabalhando com vários jogadores jovens”, conta. E basta lembrar que, no tempo de Pelé (que estreou aos 16 anos), outros craques também iniciaram-se bem cedo com a camisa santista, como Coutinho (15 anos), Clodoaldo (16), Edu (16), Diego (17), Neymar (17), Robinho (18), e outros tantos.
Essa tradição diferenciada do Santos se mantém. “Pelos contatos que tenho com jogadores de outros clubes, o Santos é quem parece dar mais assistência e estrutura aos jovens. Nos outros times, passa a impressão de que o garoto tem que subir da base e já estar voando. O Santos tem essa paciência, trabalha a transição”, garante o lateral esquerdo Emerson Palmieri, 18 anos, com passagens pela seleção sub-17 e que, no início do ano, foi observado pelo técnico Muricy Ramalho durante o Campeonato Paulista.
Mas para se ter a oportunidade, não basta o garoto ser alto ou forte: é preciso saber jogar. “Não é toda hora que vamos encontrar um Neymar ou um Robinho, mas partimos do pressuposto de que os meninos com qualidade técnica e visão de jogo devam ser valorizados. Mesmo que, naquele momento, o atleta não seja tão competitivo quanto um de maior porte físico, se ele tiver qualidade técnica, ele chegará ao profissional”, explica Moraes. “O Santos tem essa característica de jogo mais alegre, que quando o time dá liga, encanta. Isso cria um círculo virtuoso. O time oscila mais que os rivais, que costumam ter desempenhos mais regulares, mas quando desponta, o brilho do Santos é muito mais evidente”, completa.
Captação
Vários são os caminhos que levam os garotos ao Santos. Um exemplo são as escolinhas de futebol, com 70 franquias espalhadas pelo Brasil e no exterior, e cerca de 20 mil alunos. Periodicamente, os meninos são avaliados e os que se destacam passam por testes no clube, podendo fazer parte das categorias de base santistas. Hoje, 15% dos atletas das categorias de base do Santos vêm das escolas”, descreve Nicolino Bozzela Júnior, responsável pelas Escolas de Futebol do Alvinegro Praiano, em entrevista ao Boqnews em fevereiro. O principal exemplo é o meia Douglas Abner, destaque da equipe sub-15 em 2011 — passou até mesmo pela Seleção Brasileira da categoria — e que veio da unidade de Brasília (DF).
Além de escolinhas, peneiras, testes e indicações, outra forma de prospecção na qual o Santos passa a apostar é no chamado Projeto Nave. Segundo Moraes, o projeto consiste em parcerias com entidades em diferentes lugares do País, para que o clube possa fazer uma captação direta de promessas nessas regiões. Em fevereiro, foi firmada a primeira parceria, com a Sociedade Desportiva Paraense, de Marituba (PA) — próximo a Belém. “O Pará é um estado grande, com tradição e no qual seus principais clubes não vivem um bom momento, então é uma oportunidade de fazermos essa captação”, explica. Também de acordo com o gerente da base santista, outras unidades do projeto estão para sair.
Estrutura
Curiosamente, a tradição santista na formação não provém de um histórico de grandes estruturas. “Não tínhamos campo de treinamento, era só o campo da Vila Belmiro”, recorda Clodoaldo. O primeiro CT específico para base, o Meninos da Vila, surgiu só em 2006, quatro anos após a geração encabeçada por Diego e Robinho levar o Santos ao título brasileiro de 2002 e abrir os olhos do País a uma prática que parecia esquecida pelos grandes clubes do Brasil: o trabalho de base. O CT, no Saboó, tem dois campos — que levam justamente os nomes de Diego e Robinho — sendo que desde o começo deste ano, o campo “Robinho” conta com gramado sintético.
Além desse espaço, a equipe júnior (sub-20) se utiliza de um dos campos do CT Rei Pelé, do profissional — cujo gramado está em reforma e também será composto de grama sintética. O restante da estrutura (alojamento, refeitório e administrativo) fica na Vila Belmiro. Mas de acordo com o presidente santista, Luis Alvaro de Oliveira Ribeiro, a estrutura precisa ser ampliada. “Vamos celebrar um contrato com uma grande empresa que vai destinar uma verba anual para o novo CT, associando sua marca ao clube com mais tradição na revelação de jogadores. Há uma outra grande empresa, nos momentos finais de elaboração de contrato, que também pretende investir recursos poderosos na edificação”, revela.
“O ideal é termos o CT com toda a estrutura no mesmo lugar”, analisa Moraes. Segundo ele, a projeção para o novo empreendimento — ainda sen lugar definido para ser erguido — é de que se tenha pelo menos oito campos, alojamento, refeitório, espaço para receber visitantes de intercâmbio e academia. Também conforme o gerente da base alvinegra, para concepção do projeto, foram buscadas informações dentro e fora do País. “Há alguns centros bem avançados para formação de atletas por aqui, como o do São Paulo. Mas também tivemos gente do clube visitando as instalações do Barcelona, por exemplo. A ideia é que, quando executarmos o projeto do nosso centro, saibamos o que deu ou não certo em outros locais”, conclui.