Identidade alterada | Boqnews

Nacional

30 DE ABRIL DE 2010

Siga-nos no Google Notícias!

Identidade alterada

Machado de Assis, saudoso jornalista e romancista de importantes obras, nasceu antes da consolidação do sindicalismo no Brasil. Mesmo assim, já tinha o sangue da luta, instrumento que originou as agremiações trabalhistas. Em artigos assinados, discorreu que “a vida sem luta é um mar morto no centro do organismo universal”. Ainda não é possível falar […]

Por: Da Redação

array(1) {
  ["tipo"]=>
  int(27)
}
Machado de Assis, saudoso jornalista e romancista de importantes obras, nasceu antes da consolidação do sindicalismo no Brasil. Mesmo assim, já tinha o sangue da luta, instrumento que originou as agremiações trabalhistas. Em artigos assinados, discorreu que “a vida sem luta é um mar morto no centro do organismo universal”. Ainda não é possível falar em Mar Morto no quesito de lutas, mas boa parte dos sindicatos perdeu a principal função: a defesa única e exclusiva do trabalhador – principalmente na luta universal de todas as categorias, mesmo que haja subdivisões (como metalúrgicos, urbanitários, petroleiros).

Esse fenômeno que os próprios sociólogos e ex-sindicalistas costumam denominar como crise ideológica tem alguns efeitos, em especial, no número de trabalhadores associados. O último estudo divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), em 2007, mostra que, dos 90 milhões de trabalhadores, pouco mais de 16 milhões são sindicalizados (o que representa somente 17%). 

“O número pode demonstrar a descrença do trabalhador, mas não acredito que seja a principal conseqüência da crise no setor”, explica o ex-sindicalista e coordenador do Núcleo Piratininga de Comunicação (NPC), Vito Giannotti. Autor de mais de 20 livros sobre formação e comunicação sindical (entre eles, História das Lutas dos Trabalhadores no Brasil e Muralhas da Linguagem), ele menciona que a situação reflete a conjuntura atual do sindicalismo no país – e, até mesmo, no mundo. 
“Existe um problema maior, que é a mudança de mentalidade em relação à participação sindical. O trabalhador, hoje em dia, pensa em buscar o sindicato para resolver seus problemas pessoais, o que, na verdade, deveria participar em conjunto para buscar mudanças em acordos coletivos de trabalho e outras reivindicações mais gerais, que possam beneficiar todas as categorias”.

Mas esta é apenas uma parte de um cenário mais complexo sobre a aparente apatia das organizações. Alguns protagonistas que montam a peça Crise no Sindicalismo são a prova cabal do desgaste da imagem das agremiações trabalhistas. Dois deles são a evidência da política neoliberal e outra crise, a da esquerda. Mas para entender que personagens são esses, é preciso estabelecer qual era a situação política do Brasil nas décadas de 60 a 80.

História
No período da Ditadura Militar, principalmente após o AI-5, partidos de esquerda foram postos na ilegalidade, assim como movimentos sociais e estudantis. Em 67, ocorreu a retomada dos sindicatos que, até 78, foram feitas greves e reivindicações principalmente contra o chamado arrocho salarial, que é um efeito econômico quando os reajustes do salário não acompanham a inflação. O Governo Militar, na ocasião, usava esse método para poder atrair as empresas, com mão-de-obra barata.
Pelo contexto do Milagre Econômico pela gestão do militar Garrastasu Médici e pelo crescimento da indústria no Brasil, categorias como a dos metalúrgicos foram ganharam força  no movimento sindical. 
“Nessa época, os movimentos eram claros e bem organizados. Eu entendia que esse período de ditadura foi essencial para o nosso crescimento, porque tínhamos combates muito fortes, que eram os patrões e, principalmente, o Estado”, recorda o metalúrgico aposentado, Aparecido do Prado. A união foi consolidada pelos trabalhadores – também conhecida pela criação de uma unidade classista – até a existência de uma das grandes vitórias dos movimentos, com a campanha das Diretas Já. 

Consequências
Por ironia, a chegada do regime democrático, na opinião de sindicalistas e sociólogos, enfraqueceu esses movimentos, porque significa a não-intervenção do Estado em questões ligadas à saúde, comércio, educação, entre outros. Resultado: o sindicato passou a adaptar suas funções na estruturação de benefícios desses setores em suas sedes, em detrimento das lutas mais aprofundadas, como as greves.

“Benefícios como serviços de médico, dentista, planos de saúde, deixaram de ser do Estado. Como o sistema público é deficitário, os próprios trabalhadores buscam nos sindicatos tais serviços”, acrescenta Vito Giannotti.

E como fica o ato de ‘cruzar os braços’? “Poucos os sindicatos, logicamente os mais conhecidos, conseguem unir essa adaptação com a política neoliberal e manter um trabalho de base para reivindicar aos patrões melhores salários e condições de trabalho”, explica o sociólogo e especialista em educação popular, Emílio Gennari. 

“Sindicatos como o dos metalúrgicos, bancários e petroleiros conseguem fazer mais barulho, porque vivemos e ainda há resquícios da crise econômica mundial, que foi o estopim para a redução salarial e as demissões em massa”, contextualiza.

Adaptações
Além das mudanças políticas e econômicas, especialistas não deixam de criticar o modelo de formação sindical. “Os sindicalistas esqueceram da parte mais importante do movimento, que é saber como aproximar das pessoas, no caso os trabalhadores. Se eu não me torno amigo deles, fica difícil formar as organizações com eficiência. Uma maneira é envolvê-los com assuntos de interesse geral e de lazer, como é o futebol”. 

O advogado Jonadabe Rodrigues Laurindo, especialista em direito sindical, faz assessoria jurídica em diversos sindicatos de Santos e região, como o dos Metalúrgicos. Ele reforça mais um ponto da situação que deve sofrer adaptação para melhorar a imagem do sindicato. 

“As negociações de acordos coletivos de trabalho são, hoje em dia, uma das coisas mais difíceis. Com as brechas na lei, está cada vez mais complicado o Sindicato de conseguir grandes mudanças. A política de negociação ficou cada vez mais conciliatória. Mas o trabalhador deve cobrar os sindicatos para lutar pelos direitos coletivos e pedir a independência partidária na hora das negociações. Não que não se possa ter partidos atuantes, mas que eles não se tornem um instrumento de burocracia”, diz Laurindo, que cita, também, a crise das Centrais Sindicais.

Notícias relacionadas

ENFOQUE JORNAL E EDITORA © TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

desenvolvido por:
Este site usa cookies para personalizar conteúdo e analisar o tráfego do site. Conheça a nossa Política de Cookies.