O mês de maio é marcado pela campanha Maio Laranja, que foca na conscientização da sociedade para enfrentar o abuso e violência sexual infantil.
Aliás, no último sábado (18) foi o Dia Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. Quem aborda esse tema é a coordenadora do CEVISS – Comissão Municipal de Enfrentamento à Violência Sexual Infanto-Juvenil, sexóloga e escritora, Christiane Andréa. Ela participou do programa Jornal Enfoque da última quarta-feira (15).
CEVISS
De acordo com a coordenadora, os objetivos da CEVISS são de elaborar o plano municipal de enfrentamento à violência. Assim também entender de que formas serão possíveis para lidar com combate na cidade de Santos. “A gente precisa olhar para essa questão da prevenção, não dá para falar só de conscientização no Maio Laranja. Temos que fazer no ano inteiro, pois estamos percebendo que aumentaram os casos. Principalmente os casos de violência sexual na internet, aumentaram em uma porcentagem absurda, precisamos olhar para isso”.
Ela informa que a CEVISS possui o cronograma extenso para o mês todo e já nessa segunda semana de maio, foram atendidos mais de 60 adolescentes e jovens falando sobre a questão do namoro legal por conta dos relacionamentos abusivos na adolescência. Inclusive, está evidenciado que os adolescentes estão enfrentando esses tipos de relacionamentos.
Números
Para ter noção, segundo o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan Net) e a Seção de Vigilância Epidemiológica (Seviep), o número de notificações de violência sexual de 1 a 4 anos, residentes em Santos, de 2018 a 2022 foi 72. As crianças entre 5 e 9 anos foram 104 episódios.
Já com faixa etária entre 10 e 14 anos foram 133 casos. Além disso, um dado importante para ter noção, no ano de 2022, 95 casos de violência sexual ocorreram na Cidade, sendo 71,6% dos casos de violência sexual notificados foram de crianças e adolescentes entre a faixa etária de 1 ano a 19 anos. O número é o quarto menor dos últimos cinco anos.
Agressores
Em 2022, 21,1 % dos possíveis agressores eram amigos/conhecidos. Contudo, um número alarmante é que entre 2020 e 2022, o pai ficou em terceiro lugar como os supostos agressores. No primeiro ano, a porcentagem foi de 13,2%. Em 2021, foi 16,5% e 8,4% em 2022.
Efeito pandemia
Um ponto impactante é que a violência sexual cresceu dentro de casa durante a pandemia. Afinal, entre 2020 e 2021, a residência foi o lugar que mais teve ocorrências. Para ter ideia, em 2020, ocorreram 40 casos, com um percentual de 58,8%. Já no ano seguinte, a taxa foi de 67%, com 65 casos.
Regiões
Em relação ao local que mais sofreu violência sexual em Santos, de 2018 até 2022, a orla é a maior região com 143 ocorrências. Em segundo lugar surge a Zona Noroeste com 98 casos. O restante são os Morros com 81, Centro com 68 e Área Continental com 18. Além disso, as áreas não informadas tiveram 53 casos. São aquelas vítimas que não informaram o bairro onde ocorreu a violência.
Internet
De acordo com a sexóloga, para ter noção, o número de casos de violência sexual na internet aumentou mais de 400%. Sobre a violência sexual na internet, ela caracteriza que o que há de mais latente é a pornografia infantil, além de casos de assédio e outras situações, inclusive envolvendo exploração sexual infantil. Portanto, os abusadores aliciam as meninas pelas redes sociais, convidam e oferecem aquilo que não está presente na realidade da menina, como, por exemplo, uma roupa ou celular. “Hoje essa rede dá suporte para isso. Não temos mais aquelas casas onde se organizam meninas para a questão da prostituição, hoje é tudo feito via internet. É tudo por meio das redes sociais, por aplicativo, até para gente identificar é muito difícil hoje, infelizmente essa é uma questão”.
Invasão em grupos
Ela informa que tem recebido ligações de mães desesperadas porque depois da Covid, com os grupos de escolas criados nas redes sociais, parece que alguns pedófilos estão tendo acesso aos grupos.
Eles entram nos grupos e vão aliciando as crianças entre 8 e 10 anos. E depois de entrar no grupo, de forma individual, eles mandam fotos pornográficas para elas e exigem contrapartidas para não citar a exposição.
Além disso, existe a chamada de vídeo, em que o abusador realiza a ligação já pronto para mostrar as partes íntimas para a criança ou adolescente. Com essa filmagem da criança atendendo a ligação, ele utiliza isso para ameaçar e fazer com que ela atenda suas necessidades sexuais, coagindo-a.
Professores
Christiane aborda que revelações espontâneas sobre o sofrimento das violências acontecem com frequência nas escolas, porque é um espaço seguro, onde a criança se sente protegida, já que as crianças passam maior tempo por conta da educação integral.
“É ali que as revelações acontecem e onde os educadores têm a oportunidade de ver as mudanças nas crianças, geralmente qualquer mudança é perceptível de que algo diferente está acontecendo”.
Cuidados
Para notificar os casos de violência, ela informa que todo e qualquer caso sobre questão de abuso e violência sexual infanto-juvenil tem que ser tratado com o Conselho Tutelar. Dessa forma, ele é o órgão responsável pela proteção da criança. Assim, a escola comunica ao Conselho, assim como a família, que também tem que saber o que está acontecendo.
Além do adolescente estar em contato conversando pela internet com um adulto achando que também é adolescente, existe a questão dos parentes, a famosa frase “o inimigo mora em casa”.
“Neste momento pandêmico de Covid, com certeza se todos casos fossem notificados, nós beiraríamos 99%. Essa é a realidade da vida, é triste e cruel, mas temos que estar alerta em relação as pessoas que estão na casa”.
Ou seja, a sexóloga comunica que não se sabe o que aconteceu com o ser humano, acredita que a sociedade adoeceu muito, principalmente no pós-Covid. Com isso, é preciso estar olhando a movimentação e as mães devem prestar atenção na intuição.
Responsáveis
Com sua experiência profissional, Cristiane confessa que já identificou mais de 100 adolescentes vítimas de violência de todos tipos e sempre que perguntado para as mães, elas nunca perceberam algo. Portanto, elas comentam que observavam um olhar estranho, toda vez que a criança ia tomar banho, esse adulto circulava, vinha falar alguma coisa para entrar no banho e olhar.
Assim, toda vez que a criança trocava de roupa, o adulto ficava incomodado, mas achava que era impressão e ‘coisa da cabeça’.
“Eu quero dizer às mães e responsáveis que fiquem atentos à sua intuição. Às vezes, não é coisa da nossa cabeça e quando a gente achar algo fazemos um movimento para se certificar. A atenção deve ser redobrada dentro de casa”.
Bullying
Em relação ao bullying, a coordenadora diz que a violência é cíclica e toda criança que é violenta de alguma forma viveu ou está vivendo dentro de uma violência e é preciso repensar essa questão. “Temos muitas famílias vulneráveis que sofrem a questão da violência doméstica e essas crianças são frutos dessa violência”, explica.
“Quando temos essa violência entre o casal, os filhos também são vítimas, a família toda adoece e de que forma esse adolescente lida com raiva e ódio que está recebendo? Isso vai desencadear na escola, que é onde a criança passa o maior tempo. Precisamos estabelecer programas de atenção emocional para que possam lidar com essas questões da desestrutura emocional familiar dessa criança e adolescente”.
Por Todas As Flores
Christiane lançou no último sábado (18), o livro Por Todas As Flores. Ela comenta que o livro que aborda sobre as violência enfrentadas por mulheres e meninas. “Pelas minhas caminhadas por escolas municipais e estaduais, me deparei com meninas de 12 anos já vivenciando relacionamentos abusivos”.
E esse não acreditar da família que essa criança esteja se relacionando acaba fazendo com que ela não possa pedir ajuda aos pais. Elas namoram geralmente com alguém de uma faixa etária maior que a dela.
Conforme a profissional, a menina quer sair desse relacionamento e não consegue. Ela é impedida, ameaçada, inclusive com abuso psicológico. “Então, a menina está impedida de transitar e estar relacionando com outras pessoas”.
Isso a deixou estarrecida em razão da faixa etária que encontrou. Portanto, sem poder se relacionar e sem o diálogo com a família, a jovem sofre calada. Com isso, a profissional pensou que precisava fazer alguma coisa, achando interessante também para poder ajudar as escolas a falar sobre violência.
Dessa forma, uma tarefa que não é fácil, principalmente para quem não é especialista. No entanto, por meio da poesia, ela deseja auxiliar a discutir e trazer a conscientização sobre a questão que envolve todo tipo de violência contra mulheres. Além de poder dialogar com os meninos sobre esses relacionamentos abusivos.
Nos dias de hoje, o desafio em enfrentar a violência sexual possui grande importância, pois com a conscientização da sociedade sobre este tema, será possível criar um ambiente seguro para as crianças e adolescentes.
Confira a participação da coordenadora do CEVISS, Christiane Andréa no programa Jornal Enfoque da última quarta-feira (15).
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