Vítimas do consumo de metanol em bebidas alcoólicas adulteradas no Estado de SP só crescem. Pelo menos, houve o registro de seis mortes até a última quarta-feira (1). E já eram 52 notificações de suspeita de intoxicação apenas no Estado de São Paulo. O metanol é um álcool usado em solventes e outros produtos químicos, sendo extremamente perigoso quando ingerido.
Com isso, o governador Tarcísio de Freitas realizou uma reunião técnica na terça-feira (30) no Palácio dos Bandeirantes para detalhar as medidas adotadas no combate à intoxicação por metanol e a investigação dos envolvidos.
Entre as ações, o governo paulista está interditando estabelecimentos e disponibilizando mecanismos rápidos de denúncia. Além de estruturar o atendimento em toda a rede de saúde e intensificando as investigações da Polícia Civil e Secretaria da Fazenda. A interdição cautelar se aplica a estabelecimentos com suspeita de comercialização de bebidas fraudadas. Com isso, o Governo impede a circulação dessas bebidas e consegue checar a documentação do estabelecimento para verificar a origem da bebida.
Sintomas
Segundo o médico sanitarista e ex-presidente da Anvisa, Gonzalo Vecina comenta que quando a pessoa ingere algum tipo de produto que possa causar algum tipo de intoxicação tem que observar os primeiros sintomas.
“No caso das bebidas adulteradas, os primeiros sintomas vão aparecer entre 6 e 24 horas, que dizem respeito à náusea, dor de cabeça, visão turva, caminhando para perder visão. Então, sempre que ocorrer essas condições, significa que você tem uma intoxicação. Mas, poderia ser uma situação de uma intoxicação alimentar também, com diarreia e vômito”.
Com isso, ele frisa que os primeiros cuidados passam para uma ida até uma unidade de pronto atendimento, pronto socorro ou ligar para o centro de toxicologia, no telefone 0800 722 6001, onde você vai descrever sua situação e pedir orientação.
“Assim, o que deve acontecer é você ser encaminhado para algum pronto socorro. Se não tiver condição de ir pessoalmente, deve chamar o Samu”.
Visão
De acordo com o oftalmologista Marcos Alonso, os primeiros sintomas oculares que podem indicar intoxicação por metanol varia desde turvação na visão e surgimento de escotomas (manchas). E em alguns casos até mesmo cegueira propriamente dita. Alguns pacientes podem experimentar alteração na visão de cores, mudança no tamanho das pupilas, fotofobia (sensibilidade a luz) e dor no globo ocular.
“Os sintomas com frequência surgem entre 12 a 24 horas da ingestão do metanol. Nessa fase, o metanol será metabolizado no fígado e se transformar em ácido fórmico. Sendo assim, que causa acidose no organismo e destrói as células mais vulneráveis com alto consumo de oxigênio como as do nervo óptico. Quanto mais precoce iniciar o tratamento, menor será o teor de ácido fórmico convertido na corrente sanguínea e menores os danos”, explica o médico oftalmologista.
Se existe tratamento específico para os efeitos do metanol na visão, Alonso cita que o tratamento inicial é sistêmico. Dessa forma, controlando o mais rápido possível a acidose metabólica com uso de bicarbonato, neutralização do metanol com uso de etanol que é seu antídoto por competição no organismo, mas pode ser necessária a diálise.
O Ácido Folinico serve para acelerar a eliminação do Ácido Fórmico. A Piridoxina e Tiamina, por sua vez, para a neuroproteção. “Eles também podem ser necessários”. Assim como o uso de corticoides visando minimizar a inflamação decorrente da neuropatia.
Advogada
Além disso, a advogada cível Isabel Capelas explica quais os direitos das vítimas ou familiares em casos de intoxicação por bebidas contaminadas com metanol. “No âmbito civil, vítimas sobreviventes ou seus familiares (estes em caso de óbito ou incapacidade da vítima) tem direito à reparação civil, ou seja, uma indenização pelo dano sofrido”.
Ela lembra que a questão do valor a ser indenizado se refere tanto aos gastos oriundos do tratamento e prejuízos pela inatividade laboral, como também às lesões/morte. Isso vai depender de diversas questões como, por exemplo a extensão desse dano, destaca.
Além disso, é importante salientar que no caso de danos morais não existe uma espécie de “tabela”. Portanto, devendo ser analisado caso a caso pela Justiça para definir o valor compensatório cabível.
Além disso, ela cita que é importante antes de tudo termos ciência de que quem serve o produto adulterado responde civilmente por danos causados a quem os consumiu. Dessa maneira, mesmo que não tenha sido ele quem fez a adulteração ou ainda que não tenha ciência dela.
Dessa forma, mesmo que o consumidor não note imediatamente qualquer alteração no produto, mas venha a passar mal depois, sendo identificada a causa (no caso, a ingestão de produto adulterado), ele pode acionar o Poder Judiciário, imputando a responsabilidade ao estabelecimento que lhe vendeu e, ainda, à toda a rede (distribuição e fabricante) dependendo do caso.
Ressalte-se, destaca a advogada, que tudo deve ser instruído com provas que evidenciem não só a intoxicação. Mas, essa relação entre a intoxicação, o produto e estabelecimento/fornecedor, com provas para confirmar o problema.
Provas
Aliás, sobre quais provas são necessárias para que a vítima consiga entrar com uma ação civil por danos causados pela ingestão de bebida contaminada, ela informa que é recomendado que se reúnam todas as evidências possíveis. Desse modo, desde nota fiscal/recibo do estabelecimento que vendeu, até prontuários médicos e receitas de medicamentos.
“Muitas vezes não se tem recibo da compra do produto (como em alguns bares noturnos e baladas, por exemplo). Nestes casos, é importante apresentar evidências de que esteve ali, consumiu ali, tais como fotografias, vídeos em rede social e um rol de testemunhas que presenciaram os fatos”.
Indenizações
Sobre os tipos de indenizações que podem ser buscadas pelas vítimas ou seus familiares, ela acrescenta que a indenização por danos morais e materiais pode ser pleiteada conjuntamente, dependendo do caso.
“Tudo que for relativo a gastos com hospitais, medicamentos e outras questões de ordem financeira advindos da situação experimentada pela vítima referem-se a de danos materiais. Também se englobam em danos materiais os lucros cessantes, que são valores que a vítima deixou de receber devido o evento danoso (por exemplo, o referente ao ganho dos dias que teve que deixar de trabalhar por conta do envenenamento)”.
Eventuais lesões físicas (cegueira, alergias, perda de função/órgão), bem como problemas de ordem emocional/psicológica, e até mesmo a morte da vítima são abarcados pelo dano moral, o qual deverá ter seu montante fixado pelo juiz de acordo com as circunstâncias de cada caso.
Segurança de alimentos
A especialista em segurança de alimentos, Paula Aloize dá dicas de como diferenciar uma bebida original de uma falsificada.
“O consumidor não tem como realizar uma análise técnica, mas pode adotar medidas preventivas que reduzem o risco. O primeiro passo é sempre desconfiar de preços muito abaixo do mercado. Nenhuma bebida legítima consegue ser vendida a custos muito reduzidos sem levantar suspeitas”.
Além disso, é importante verificar se o lacre da garrafa está intacto, se o rótulo está bem acabado, se a numeração do lote está legível.
Comprar apenas em locais de confiança é fundamental, porque muitos crimes acontecem justamente na distribuição e revenda informal. Em bares, a recomendação é exigir que a garrafa seja aberta na sua presença.
“Esses cuidados não eliminam totalmente o risco, mas funcionam como barreiras práticas. O consumidor informado é a última linha de defesa quando a fiscalização não consegue estar em todos os lugares”.
Sinhores
O Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares da Baixada Santista e Vale do Ribeira (Sinhores) faz um sério alerta às autoridades: é urgente intensificar o combate à falsificação de bebidas em na região.
De acordo com o presidente do Sinhores, Arthur Veloso, essa prática criminosa tem prejudicado gravemente tanto os empresários do setor quanto os consumidores. Portanto, que acabam sendo vítimas dessa ameaça.
Segundo pesquisa da Federação de Hotéis, Restaurantes e Bares do Estado de São Paulo, que ocorreu em abril deste ano, 36% das bebidas comercializadas no Brasil são falsificadas, adulteradas ou contrabandeadas — um índice alarmante que não pode ser ignorado.
“Exigimos maior rigor na fiscalização e medidas efetivas para proteger o mercado legal. Enquanto isso, orientamos os consumidores a escolherem somente estabelecimentos legalizados, com alvará de funcionamento, como forma de se protegerem. Aos empresários do segmento, reforçamos a necessidade de extrema atenção à procedência dos produtos. Portanto, exigindo nota fiscal, desconfiando de preços muito abaixo do mercado. Assim como, observando atentamente detalhes como tipo de garrafa, lacres, impressões e até o cheiro das bebidas”, informou, em nota à Imprensa.
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