Passados dez dias da queda do jatinho Cessna no bairro do Boqueirão que vitimou o ex-candidato à presidência da República pelo PSB, Eduardo Campos, moradores do entorno do acidente ainda vivem incertezas quanto aos prejuízos que sofreram com a tragédia.
Vidros quebrados, portas deslocadas, móveis perdidos, buracos nas paredes são apenas alguns dos danos gerados pelo impacto da aeronave. Diante disso, os proprietários se mostram confusos e ainda não sabem como devem proceder para serem ressarcidos.
Os moradores de um dos prédios atingidos na Rua Vahia de Abreu tiveram o seu prejuízo minimizado em razão do seguro que o edifício de três andares possui. No entanto, a cobertura da empresa limita-se aos danos externos, como vidros e janelas. Os demais danos ficam por conta dos moradores, que por sua vez buscam uma indenização da empresa proprietária ou da seguradora do avião.
A moradora do prédio Almerinda Batista Pinto acha que ninguém vai pagar pelo o que foi perdido dentro de casa. “Entrar com uma ação contra os responsáveis é muito demorado e difícil. Temos esperança, mas sabemos que existem casos de pessoas que não receberam até hoje. Quem sabe um dia os meus netos recebam”, lamenta.
O neto de Almerinda que mora em outro apartamento no mesmo edifício, Marco Aurélio Bonilha Júnior, teve mais sorte. Apenas alguns vidros quebrados, um deslocamento do ar condicionado e um tênis perdido que estava na janela na hora do impacto.
Almerinda afirma ainda que ela e os demais moradores estão confusos e não sabem como proceder para obter o ressarcimento pelos danos internos. O mesmo ocorre com Edmar da Silva Fonseca, filho de Odessa da Silva Fonseca, proprietária do apartamento que fica acima da casa de Almerinda.
“Tivemos um auxílio grande da Prefeitura e Polícia Militar nos primeiros dias que precederam o acidente. Mas não houve esclarecimento sobre os prejuízos materiais e emocionais que a minha mãe sofreu. Falta um acompanhamento mais de perto a respeito dessa tratativa, um direcionamento”, diz.
Estabelecimento
Dentre os danos materiais, a Academia Mahatma foi uma das mais penalizadas. Equipamentos de ginástica e vidros de acrílico foram completamente perdidos. Além, é claro, de diversos buracos nas paredes e muros. Para piorar a situação, o local não tinha qualquer tipo de seguro, o que complica o cenário para Benedito Juarez Câmara, proprietário da academia. Ele calcula um prejuízo mínimo de R$ 1,5 milhão.
“Eu ainda não tinha o seguro porque sou dono há pouco tempo e encontrei o local em uma condição precaríssima. Tive que cortar gastos e me abster de despesas”, explica Juarez, na expectativa de encontrar respostas sobre o futuro do negócio.
“Não temos a quem recorrer. A situação é complicada. Com razão, muitos clientes vêm até aqui para o cancelamento das atividades físicas e exigem o dinheiro de volta”.
Em contrapartida, Juarez recebe auxílio de amigos proprietários de outras academias e de alguns fregueses, que oferecerem alternativas para pagamento. O local segue interditado e depende da apresentação de um laudo técnico para voltar a funcionar.
Orientação
A Prefeitura esclarece que houve orientação aos moradores no dia do acidente (dia 13), fato que se estendeu até o domingo (17). “No dia do acidente, ocorreram diretrizes para a abertura do Boletim de Ocorrência, que é o primeiro passo para a reivindicação dos moradores aos possíveis responsáveis civis pela indenização”, disse o coordenador do Cidoc/Procon, Rafael Quaresma.
De acordo com ele, a responsabilidade de indenização recairá sobre a seguradora da aeronave, no caso, a Bradesco Seguros. Contudo, há um imbróglio a respeito de quem seria o real proprietário do avião, o que acaba retardando o ressarcimento aos lesados pelo acidente.
Entenda o imbróglio
Segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), a aeronave era propriedade da Cessna Finance Export Corporation e tinha como operadora arrendatária a empresa que se encontra em recuperação judicial, a AF Andrade Empreendimentos e Participações Ltda, conforme consta no Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB).
No entanto, de acordo com documento enviado pela empresa à Anac, o avião foi vendido a João Carlos Lyra Pessoa Mello de Filho, que por sua vez não notificou a mudança nos registros da Anac. Portanto, para a Anac a arrendatária permanece a AF Andrade.
Esse imbróglio sobre a efetiva propriedade do avião acarreta problemas com o seguro do jatinho. De acordo com reportagem publicada no jornal Folha de S. Paulo, a apólice da Bradesco Seguros está em nome do grupo AF Andrade. A omissão da venda do avião para terceiros pode atrapalhar ou atrasar o pagamento do seguro.
Próximos passos
Rafael Quaresma explica que não é necessário aguardar a resolução deste problema para o acionamento da justiça comum. Todavia, “esse processo vai judicializar a questão, o que deve demandar mais tempo”. Ele recomenda que o ideal seja aguardar as devidas identificações dos proprietários do Cessna para a abertura do processo administrativo “onde a seguradora da aeronave verificará as causas e consequências do evento e consequentemente mensurar a indenização”.
O coordenador da Coordenadoria de Assistência Judiciária Gratuita e Orientação Jurídica ao Cidadão (Cadoj), Mauro Mancuzo, reiterou que houve apoio e esclarecimento de dúvidas durante os quatros dias posteriores ao acidente.
“Os moradores foram orientados a acionarem seus respectivos seguros, listarem e documentarem (por meio de fotos e vídeos) os prejuízos sofridos e isso inclui uma eventual hospedagem em razão da interdição temporária”.
Mancuzo esclareceu também que o Cadoj funciona por meio de uma parceria celebrada entre a Prefeitura de Santos e a Ordem dos Advogados do Brasil – Subseção Santos (OAB) e tem como diretriz oferecer assistência jurídica a pessoas com até quatro salários mínimos.
Nesse caso, especialmente. o universo foi ampliado para até seis salários mínimos, de modo que aumente o número de beneficiados.
“Até agora duas ou três pessoas lesadas pelo acidente compareceram ao Cadoj”. No local, é feita uma triagem e instrução dos documentos necessários para o andamento do requerimento de indenização. “Esperamos a resolução do imbróglio para que a seguradora da aeronave seja contatada e os prejudicados encaminhados aos advogados conveniados do Cadoj para o início dos trabalhos”.
O Cadoj fica à Avenida Campos Sales, 128, 2º andar. Telefone: 3202-1900.