Na mira do Ecad | Boqnews

Cidades

31 DE JULHO DE 2009

Siga-nos no Google Notícias!

Na mira do Ecad

O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) é uma sociedade civil, de natureza privada, que visa garantir os direitos autorais de milhares de compositores do País. Situações envolvendo o órgão são, hoje, pano de fundo de profundas discussões entre os mais diversos segmentos.De um lado, realizadores de eventos, donos de casas noturnas e varejo, […]

Por: Da Redação

array(1) {
  ["tipo"]=>
  int(27)
}

O Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad) é uma sociedade civil, de natureza privada, que visa garantir os direitos autorais de milhares de compositores do País. Situações envolvendo o órgão são, hoje, pano de fundo de profundas discussões entre os mais diversos segmentos.

De um lado, realizadores de eventos, donos de casas noturnas e varejo, além de emissoras de rádio e TV que contestam o pagamento de um percentual específico ao Ecad. Do outro, os próprios autores, os quais muitos alegam sofrer prejuízos financeiros devido à fiscalização falha e à distribuição dos pagamentos, além das baixas remunerações repassadas pela execução pública de suas obras. Afinal, até onde vão os direitos e os deveres do Ecad?

No Alvo
Atualmente, essa é a pauta de maior discussão entre donos de estabelecimentos de todo o País e um problema crônico que vem sendo vivenciado pelo proprietário de um restaurante localizado na Aparecida, em Santos.

Roberto Vicente recebe, há 15 anos (período em que atua no ramo), cobranças enviadas pelo correio ou por meio de um fiscal do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (Ecad), que somam mais de R$ 6 mil, devido a multas e aos reajustes fiscais anuais.

A justificativa da cobrança: uma televisão e duas caixinhas de som localizadas ao lado do caixa do restaurante. “Não sei dizer, ao certo, no que eles baseiam a taxa mensal cobrada. Só sei que, a cada dois ou três anos, aparecem no meu estabelecimento e argumentam que como o som e a televisão propagam obras musicais de autores, tenho de arcar com o pagamento”, explica.

 “Acho um absurdo, porque não trabalho com música ao vivo e utilizo as caixinhas de som fora do horário de funcionamento do restaurante, para meu próprio bem-estar. Recuso-me a pagar e eles propõem acordos, mas sei que, no fundo, querem dinheiro e dificilmente repassarão a verba aos músicos autorais”, afirma.

O dono de uma casa noturna localizada no Centro de Santos, cujo nome foi preservado, também compartilha da mesma opinião quando o assunto são as cobranças efetuadas pelo Ecad. “Anualmente, são mais de R$ 4 mil que destino a pagamentos para o Escritório. Acho que o princípio ostentado pelo Ecad é justo, mas acho indevida a forma como é cobrada e os critérios são completamente falhos”, defende. “Meu vizinho mantém em frente ao seu estabelecimento, semanalmente, um DJ e um telão no qual reproduz clipes musicais e nunca sofreu qualquer cobrança”, diz.
Por outro lado, o Ecad frisa que a lei deve ser igual para todos e não se pode conceber que um estabelecimento possa ter sonorização paga e o outro, não. “Quando reproduzida fora do recinto familiar e de forma pública, os direitos autorais da música devem ser respeitados e pagos”, esclarece o gerente-executivo do órgão, Márcio Fernandes.

Quando se tratam de casas noturnas, o responsável deve pagar ao Ecad os direitos autorais das músicas reproduzidas a partir de um percentual com base nos ingressos vendidos ou na metragem quadrada do estabelecimento, se a entrada de visitantes não exigir pagamentos de ingressos. No caso de festas promovidas em salões, o valor a ser pago pelo realizador é calculado com base no custo do espaço alugado, variando de 10% a 15% a mais do preço do aluguel, dependendo se a música for ao vivo ou eletrônica, respectivamente.

“Quem realiza festas de casamento e aniversário, por exemplo, investe em buffet, iluminadores, decoradores, clube, suporte, e a música é mais um item de fornecimento que, assim como os demais, melhoram a qualidade do evento e também deve ser custeada”, completa Fernandes.
O gerente-executivo explica que clubes e salões de eventos devem orientar que os realizadores da festa compareçam antes ao Ecad de sua cidade e efetuem o pagamento por meio de rede bancária. Após o procedimento, o Ecad envia ao local operadores de gravação externa que identificam os responsáveis e gravam as músicas tocadas por meio de um equipamento chamado Ecad-Tecsom.

“Obviamente, não é possível cobrir todas as festas realizadas. Então, o Ecad seleciona uma fatia dos eventos para encaminhar seus operadores e a distribuição dos valores dos direitos autorais é feita com base nesta amostragem”, explica.


Músicos revelam-se insatisfeitos


Apesar de ter sido criado no final da década de 70 como forma de unir sociedades de defesa das exibições musicais – e, hoje, visar a garantia dos direitos autorais e financeiros dos compositores – muitos músicos mostram-se insatisfeitos com numerosas questões envolvendo o Ecad.

O compositor Vagner Gama, autor de mais de 400 obras, das quais 20 registradas junto ao Ecad, é conhecido por sua canção Tempestade, sucesso do grupo de pagode Coisas de Pele, que está tocando nas rádios da Baixada Santista. “É decepcionante ver os valores que são repassados aos compositores, porque a porcentagem distribuída, principalmente às sociedades filiadas ao Ecad, é muito alta”.

O procedimento de arrecadação e distribuição de direitos autorais de execução de canções nacionais e estrangeiras possui como intermediárias dez associações de música. Com base no valor total da arrecadação, 75% são repassados ao autor da obra, que deve ser filiado a alguma dessas associações, que ficam com 8% do ônus. Os demais 17% da arrecadação são repassados ao próprio Ecad.

“A fiscalização do Ecad melhorou muito nos últimos tempos, principalmente nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, mas ainda é falha. Tenho um amigo que compôs uma famosa música para o grupo Sorriso Maroto, que toca direto nas rádios, e recebeu um boleto com pagamento baseado em apenas três vezes de execução pública”, desabafa.

Fernandes, do Ecad, defende que há em atividade nacional mais de 5,4 mil rádios AM e FM cadastradas ao Escritório e que pouco mais da metade paga os direitos autorais. “Infelizmente, temos um índice de 43% de inadimplência neste setor. Já propomos ações judiciais e, agora, é questão de aguardar resposta do Judiciário”.

Na TV
Autor de conhecidas trilhas sonoras da Rede Globo de Televisão, o compositor Tim Rescala define o Ecad como “negócio escabroso”. O músico ressalta que, até 2001, compositores de música para TV, incluindo temas de personagem, músicas de fundo (backgrounds), entre outros, recebiam a mesma pontuação para o pagamento dos direitos. Hoje, os backgrounds sofrem uma redução de sua pontuação em 1/12 em relação ao valor original. “O Ecad tem na TV, praticamente, metade de toda sua arrecadação. É claro que eles perceberam que têm como ganhar muito dinheiro ali. Diminuíram nossa pontuação e cobram mais das emissoras”, diz.

Para que possa ser autorizada a utilizar músicas de seus compositores, a Rede Globo precisa arcar com um valor mensal fornecido ao Escritório. A reivindicação do Ecad na Justiça é de 2,5% de todo o faturamento da Globo, o equivalente a R$ 16 milhões por mês. Em contestação, a rede deposita apenas R$ 4,1 milhões mensais, em juízo.

“Só em 2007, o Ecad faturou mais de 300 milhões. Este tipo de empresa não pode ter lucro. Eles são uma entidade privada, mas protegidos pela lei, porque fiscalizam mas não possuem órgão fiscalizador. Antigamente, até possuíam um que foi extinto no Governo Collor”, ressalta. “O Ecad está ‘solto’. Cria seus próprios critérios visando altos lucros e isso pode levar inúmeros músicos à falência”.

Rescala está respondendo processo sob acusação de difamação ao Ecad – em virtude de um artigo seu publicado no ano passado, no qual referiu-se ao órgão como “caixa-preta”. Segundo o músico, em contrapartida, 50 músicos (25 da Rede Globo e mais 25 do SBT) também entraram com ação judicial contra a norma interna que estabelece menor valor de pontuação para os backgrounds.

O gerente-executivo jurídico do Ecad, Samuel Fahel, explica que esse é um caso inédito na Justiça, pois o direito de resguardo fica para quem tem probabilidade de ganho. “O Ecad ganhou a ação em primeiro lugar.

Um desembargador ‘desavisado’ permitiu que eles recorressem com ação cautelar, com valores aleatórios reclamados na ordem de R$ 140 milhões”, explica. “Houve, inclusive, desistência de muitos ‘trilheiros’ durante o processo. Hoje, Tim e mais sete compositores acreditam que dos 142 milhões reclamados pela Globo, eles façam jus a R$ 140 milhões, dentro de um universo que reúne mais de 10 mil titulares, no mínimo, na Rede”, diz.

Ele ainda justifica que não há qualquer injustiça no redutor aplicado a qualquer obra musical quando executada em característica de “música de fundo”, ou background, pois é uma prática de mercado, que jamais logrou qualquer inconformismo. “O redutor aplicado nas próprias negociações ou cobranças das editoras (ABEM) suplanta 1/12 avos, recebendo a música de fundo 5% da música executada como tema”.


Após CPI, moção à criação de  conselhos


Constituída com a finalidade de investigar possíveis irregularidades praticadas pelo Ecad, referentes ao eventual abuso bem como à falta de critérios na cobrança de direitos autorais, foi dado início, esse ano, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) Ecad, cuja reapresentação do requerimento de abertura foi realizada pelo deputado estadual Bruno Covas (PSDB).

Durante a Comissão, o órgão foi acusado de arrecadar sem distribuir a verba e, ainda, efetuar cobranças sem critério, planilha que apoie a cobrança ou controle do que será distribuído aos autores. Foi pontuado também que 5 mil emissoras de rádio e TV devem R$ 400 milhões para compositores e autores. “O que vemos, hoje, é que o Ecad utiliza-se de um monopólio legal para arrecadar e distribuir verbas e que ele mesmo estabelece para si os critérios de arrecadação e distribuição”, esclarece o deputado. “No mundo, há até a necessidade de um monopólio, mas diante da existência de um órgão governamental estabelecendo critérios mínimos e máximos de cobrança, o que não existe no momento”, diz.

Concluída em junho, a CPI deu vazão a uma moção que será apresentada pelo deputado, no segundo semestre deste ano, às autoridades de Brasília, com a sugestão de criação de um Conselho Estadual de Direito Autoral, a fim de fomentar discussões a respeito do retorno do Conselho Nacional. “Duas CPIs já foram realizadas há alguns anos com a mesma finalidade. Por isso, nosso objetivo, agora, é realizar amplo trabalho político para que a terceira comissão gere bons resultados”,  ressalta Covas.

Segundo dados fornecidos pelo órgão, em 2008, a instituição arrecadou, aproximadamente, R$ 332 milhões, 10% a mais que no ano anterior. O Ecad ressalta que o valor distribuído aos titulares de direitos autorais e conexos (autores, intérpretes, músicos, editores, produtores fonográficos, entre outros) cresceu 8,38% em relação ao ano de 2007, totalizando cerca de R$ 271 milhões. Foram 73,7 mil titulares beneficiados. Alguns segmentos apresentaram significativo aumento nos valores distribuídos, entre os quais: shows e eventos (25,65%); emissoras de rádio (13,95%), música ao vivo (9,86%) e direitos gerais (sonorização ambiental) com 26,82%.


 


 

Notícias relacionadas

ENFOQUE JORNAL E EDITORA © TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

desenvolvido por:
Este site usa cookies para personalizar conteúdo e analisar o tráfego do site. Conheça a nossa Política de Cookies.